O Conde de Monte Cristo - Cap. 47: A parelha pigarça Pág. 470 / 1080

- São, sim, senhor. Conhece-a?

- A Sr.ª Danglars?... Tenho essa honra e sinto dupla satisfação por a ter salvo do perigo que esses cavalos a fizeram correr. Porque esse perigo podê-lo-ia atribuir a mim.

Comprei ontem esses cavalos ao barão, mas a baronesa pareceu lamentar tanto a sua perda que lhos restituí ontem mesmo, suplicando-lhe que os não recusasse da minha mão.

- Mas nesse caso, o senhor é - o conde de Monte-Cristo, de quem Hermine tanto me falou ontem?

- Sou, sim, minha senhora - confirmou o conde.

- E eu, senhor, sou a Sr.ª Héloñse de Villefort.

O conde cumprimentou como um homem diante do qual se pronuncia um nome perfeitamente desconhecido.

- Oh, como o Sr. de Villefort lhe ficará reconhecido! - prosseguiu Héloñse. - Porque, enfim, dever-lhe-á a vida de ambos, visto o senhor lhe restituir a mulher e o filho.

Certamente, sem a intervenção do seu generoso criado, esta querida criança e eu estaríamos mortos.

- Infelizmente, minha senhora, e ainda tremo do perigo que correram!

– Oh, espero que me permita recompensar contiguamente a dedicação desse homem!

- Minha senhora - respondeu Monte-Cristo -, não me estrague Ali, peço-lhe, nem com elogios, nem com recompensas. São hábitos que não quero que ele tome. Ali é meu escravo; salvando-lhe a vida, serviu-me e é seu dever servir-me.

- Mas ele arriscou a vida - redarguiu a Sr.ª de Villefort, a quem aquele tom de amo e senhor se impunha singularmente.

- Salvei essa vida, minha senhora - respondeu Monte-Cristo. - Por consequência, ela pertence-me.

A Sr.ª de Villefort calou-se. Talvez reflectisse acerca daquele homem, que à primeira vista causava tão profunda impressão nos espíritos.

Enquanto durou o silêncio, o conde pôde examinar à vontade o garoto, que a mãe cobria de beijos. Era pequeno, frágil, branco como as crianças ruivas, e no entanto uma floresta de cabelos pretos, rebeldes a qualquer frisagem, cobria-lhe atesta abaulada e, caindo-lhe sobre os ombros e emoldurando-lhe o rosto, redobravam-lhe a vivacidade dos olhos cheios de dissimulada malícia e de juvenil maldade. A boca, que ainda mal recuperara a sua cor vermelha, era grande e de lábios finos. As feições daquele garoto de oito anos eram já as de um rapaz de doze anos pelo menos. O seu primeiro movimento foi libertar-se com um safanão brusco dos braços da mãe e ir abrir o cofrezinho donde o conde tirara o frasco de elixir. Em seguida, sem pedir licença a ninguém, como uma criança habituada a satisfazer todos os seus caprichos, pôs-se a destapar os outros frascos.

- Não mexa nisso, meu amigo - disse vivamente o conde. - Alguns desses licores são perigosos, não só bebidos, mas até respirados.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069