E antes de Dantès pensar em abrir a boca para lhe responder, antes de ver onde o carcereiro pousava o pão, antes de se dar conta do sítio onde estava a bilha e antes de volver os olhos para o canto onde se encontrava a palha destinada a servir-lhe de cama, o carcereiro pegou no lampião, saiu, fechou a porta e privou o prisioneiro da luz baça que lhe mostrara como que ao clarão de um relâmpago as paredes encharcadas da sua prisão.
Encontrou-se então sozinho no meio das trevas e do silêncio, tão mudo e tão sombrio como as abóbadas cujo frio glacial sentia descer sobre a testa escaldante.
Quando os primeiros raios da alvorada trouxeram um pouco de claridade àquele antro, o carcereiro voltou com a ordem de deixar o prisioneiro onde se encontrava. Dantès nem sequer mudara de sítio. Uma mão de ferro parecia tê-lo pregado no mesmo local onde na véspera se detivera. Apenas o seu olhar profundo se ocultava debaixo de um inchaço causado pelo vapor húmido das suas lágrimas. Estava imóvel e olhava para o chão.
Passara assim toda a noite de pé e sem dormir um só instante.
O carcereiro aproximou-se dele, andou à sua volta, mas Dantès não pareceu vê-lo.
Bateu-lhe no ombro, Dantès estremeceu e abanou a cabeça.
- Não dormiu? - perguntou-lhe o carcereiro.
- Não sei - respondeu Dantès.
O carcereiro olhou-o com espanto.
- Não tem fome? - continuou.
- Não sei - respondeu novamente Dantès.
- Quer alguma coisa?
- Queria ver o governador.
O carcereiro encolheu os ombros e saiu.
Dantès seguiu-o com a vista, estendeu as mãos para a porta entreaberta, mas a porta fechou-se.
Então o peito pareceu rasgar-se-lhe num longo soluço. As lágrimas que lhe enchiam o peito brotaram como dois riachos.
Ajoelhou-se, encostou a testa ao chão e rezou durante muito tempo. Repassou no espírito toda a sua vida passada e perguntou a si mesmo que crime cometera na vida, tão jovem ainda, que merecesse tão cruel punição.
O dia passou-se assim. Comeu apenas alguns nacos de pão e bebeu alguns golos de água. Tão depressa ficava sentado e absorto nos seus pensamentos como caminhava a toda a volta da prisão, qual fera encerrada numa jaula de ferro.
Havia sobretudo um pensamento que o punha fora de si: o de que durante a travessia, onde, na ignorância do local para onde o conduziam, permanecera tão calmo e tranquilo, poderia ter-se dez vezes deitado ao mar e, uma vez na água, graças à sua perícia de nadador, graças ao hábito que o tornara um dos mais hábeis mergulhadores de Marselha, desaparecer debaixo de água, fugir aos guardas, alcançar a costa, escapar-se, esconder-se em qualquer enseada deserta, esperar um navio genovês ou catalão, alcançara Itália ou a Espanha, e de lá escrever a Mercédès para que se lhe juntasse.