- Até que enfim! - exclamou Monte-Cristo. - Aí está uma condecoração que me parece sensatamente dada. Então, se encontrar segunda vértebra, fá-lo-ão comendador?
- É provável - respondeu Morcerf.
- E aquele que teve a singular ideia de vestir uma casaca azul bordada a verde quem é?
- Não foi ele que teve a ideia de se meter naquela casaca, foi a República, a qual, como sabe, era um tanto artista. Por isso, desejando dar um uniforme aos académicos, pediu a David que lhe desenhasse uma casaca.
- Tem razão - concordou Monte-Cristo. - Portanto aquele senhor é um académico?
- Há oito dias que faz parte da douta assembleia.
- E qual é o seu mérito, a sua especialidade?
- A sua especialidade? Parece-me que espeta alfinetes na cabeça de coelhos, que obriga as galinhas a comer garança e que extrai com barbas de baleia a espinal-medula aos cães.
- E é da Academia das Ciências por isso?
- Não, da Academia Francesa.
- Mas que tem a Academia Francesa a ver com essas coisas?
- Vou dizer-lhe. Parece...
- Que as suas experiências fizeram, decerto, a ciência dar um grande passo?
- Não, mas que escreve num excelente estilo.
- O que deve lisonjear enormemente o amor-próprio dos coelhos em que espeta alfinetes na cabeça, as galinhas cujos ossos tinge de vermelho e os cães a que extrai a espinal-medula - comentou Monte-Cristo.
Albert desatou a rir.
- E aquele? - perguntou o conde.
- Qual?
- O terceiro.
- Ah! O de casaca azul-clara?
- Sim.
- É um colega do conde que acaba de se opor energicamente a que a Câmara dos Pares tenha um uniforme. Por causa disso obteve um grande êxito na tribuna. Andava de candeias às avessas com as gazetas liberais, mas a sua nobre oposição aos desejos da corte acaba de o reconciliar com elas. Fala-se em nomeá-lo embaixador.
- E quais são os seus títulos para o pariato?
- Escreveu duas ou três óperas cómicas, intentou quatro ou cinco acções contra o Siècle e votou cinco ou seis anos pelo ministério.
- Bravo, visconde! - exclamou Monte-Cristo, rindo. - O senhor é um cicerone notável. Agora, importa-se de me fazer um favor?
- Qual?
- Não me apresente a esses cavalheiros e se eles pedirem para me serem apresentados, previna-me.
Neste momento o conde sentiu que lhe pousavam uma mão no braço. Virou-se. Era Danglars.
- Ah! É o senhor, barão?
- Porque me chama barão? - redarguiu Danglars. - Bem sabe que não ligo importância ao meu título.