- Meu caro anfitrião, e vós, signora - disse Albert em italiano -, desculpai a minha estupefacção. Estou completamente aturdido, como é natural. Eis-me no Oriente, no verdadeiro Oriente, infelizmente não tal como o vi, mas sim tal como o sonhei em Paris. Ainda há pouco tinha a sensação de ouvir passar o ónibus e tocar as campainhas dos vendedores de limonadas... Oh, signora, que pena eu não falar grego! A sua conversação, juntamente com este ambiente feérico, proporcionar-me-ia uma noite de que nunca mais me esqueceria.
- Falo bastante bem o italiano para falar consigo, senhor - respondeu tranquilamente Haydée. - E farei o possível, se gosta do Oriente, para que o reencontre aqui.
- De que posso falar? - perguntou baixinho Albert a Monte-Cristo.
- Mas de tudo o que quiser. Do seu país, da sua juventude, das suas recordações. Depois, se preferir, de Roma, de Nápoles ou de Florença.
- Oh, não valeria a pena estar diante de uma grega para lhe falar de tudo o que falaria a uma parisiense! - protestou Albert. - Deixe-me falar-lhe do Oriente.
- De facto, meu caro Albert, é a conversação que mais lhe agrada.
Albert virou-se para Haydée.
- Com que idade, signora, deixou a Grécia? - perguntou.
- Aos cinco anos - respondeu Haydée.
- E ainda se lembra da sua pátria?
- Quando fecho os olhos, revejo tudo o que vi. Há dois olhares: o olhar do corpo e o olhar da alma. O olhar do corpo pode às vezes esquecer, mas o da alma lembra-se sempre.
- E qual é o tempo mais distante de que se recorda?
- Mal andava. A minha mãe, que se chamava Vasiliki (Vasiliki quer dizer real) - acrescentou a jovem, erguendo a cabeça. - Aminha mãe pegava-me na mão e, ambas cobertas com um véu, depois de metermos na bolsa todo o ouro que possuíamos, íamos pedir esmola para os prisioneiros dizendo: «Quem dá aos pobres, empresta a Deus.» Depois, quando tínhamos a bolsa cheia, regressávamos ao palácio e, sem dizer nada ao meu pai, mandávamos todo o dinheiro que nos tinham dado, tomando-nos por pobres mulheres, ao superior do convento, que o distribuíaentre os prisioneiros.
- E nessa época que idade tinha?
- Três anos - respondeu Haydée.
- Então, lembra-se de tudo o que se passou à sua volta a partir dos três anos?
- De tudo.
- Conde - disse baixinho Morcerf a Monte-Cristo -, devia permitir à signora que nos contasse um pouco da sua história. Proibiu-me de lhe falar do meu pai, mas talvez ela me fale dele, e não imagina quão feliz seria ouvindo sair o seu nome de tão bonita boca.