O Conde de Monte Cristo - Cap. 77: Haydée Pág. 746 / 1080

»Mas ao mesmo tempo, por essa abertura soaram vinte tiros e as chamas, como se saíssem da cratera de um vulcão, alcançaram as tapeçarias, que devoraram.

»No meio de todo aquele tumulto horrível, no meio daqueles gritos terríveis, dois tiros mais distintos do que os outros e dois gritos mais dilacerantes do que quaisquer outros gelaram-me de terror. As duas explosões tinham atingido mortalmente o meu pai e fora ele que soltara os dois gritos.

»No entanto, tinha ficado de pé, agarrado a uma janela. Minha mãe sacudia a porta para ir morrer com ele, mas a porta estava fechada por dentro.

»À roda dele, os palicários contorciam-se nas convulsões da agonia; dois ou três, que não estavam feridos ou o estavam apenas ligeiramente, atiraram-se das janelas. Ao mesmo tempo, todo o pavimento estalou, quebrado por baixo. Meu pai caiu sobre um joelho. Imediatamente se estenderam vinte braços armados de sabres, pistolas e punhais, e vinte golpes atingiram simultaneamente um só homem. Meu pai desapareceu num turbilhão de fogo ateado por aqueles demónios rugidores, como se o Inferno se lhe tivesse aberto debaixo dos pés.

«Senti-me cair no chão; era a minha mãe que perdia os sentidos.

Haydée deixou cair os braços, soltou um gemido e olhou o conde, como se lhe perguntasse se estava satisfeito com a sua obediência.

O conde levantou-se, aproximou-se dela, pegou-lhe na mão e disse-lhe em romaico:

- Descansa, querida filha, e ganha coragem pensando que há um Deus que castiga os traidores.

- Uma história espantosa, conde - disse Albert, muito preocupado com a palidez de Haydée. - Já estou arrependido de ter sido tão cruelmente indiscreto.

- Isto não é nada - respondeu Monte-Cristo.

Depois, pôs a mão na cabeça da jovem e acrescentou:

- Haydée é uma mulher corajosa e encontra por vezes alívio falando dos seus sofrimentos.

- Porque, meu senhor - disse vivamente a jovem -, porque os meus sofrimentos me recordam os teus benefícios.

Albert olhou-a com curiosidade, porque ela ainda não contara o que mais desejava saber, isto é, como se tornara escrava do conde.

Haydée viu expresso o mesmo desejo, tanto nos olhos do conde como nos de Albert. E continuou:

- Quando a minha mãe recuperou os sentidos, estávamos diante do serasqueiro.

«- Mata-me - disse ela -, mas poupa a honra da viúva de Ali.

»- Não é a mim que te deves dirigir - redarguiu Kurchid.

»- Então a quem?

»- Ao teu novo senhor.

»- Quem é?

»- Ei-lo.

«E Kurchid indicou-nos um daqueles que mais tinham contribuído para a morte do meu pai - acrescentou a jovem, com uma cólera sombria.

- Tornaram-se então propriedade desse homem? - perguntou Albert.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069