O Conde de Monte Cristo - Cap. 82: O assalto Pág. 791 / 1080

A primeira ideia do conde foi crer numa artimanha de ladrões, cilada grosseira que lhe indicava um perigo medíocre para o expor a um perigo mais grave. Ia portanto mandar levar a carta a um comissário de polícia, apesar da recomendação e talvez mesmo por causa da recomendação do amigo anónimo, quando de súbito lhe ocorreu que se poderia tratar, com efeito, de algum inimigo especial seu, que só ele pudesse reconhecer e de quem, se assim fosse, só ele poderia tirar partido, como fizera Fieschi com o mouro a quem quisera assassinar. Já conhecemos o conde; não necessitamos portanto de dizer que era um espírito cheio de audácia e vigor que se obstinava contra o impossível com essa energia exclusiva dos homens superiores.

Pela vida que levava e pela decisão que tomara e que lhe impunha não recuar diante de nada, o conde saboreara já prazeres desconhecidos nas lutas que por vezes travara com a natureza, que é Deus, e com o mundo, que pode muito bem passar pelo Diabo.

- Não querem roubar os meus documentos - murmurou Monte-Cristo -, querem matar-me. Não são ladrões, são assassinos. Não quero que o Sr. Prefeito da Polícia meta o nariz na minha vida. Sou suficientemente rico para arcar com as despesas e não agravar com isto o orçamento da sua administração.

O conde chamou Baptistin, que saíra da sala depois de entregara carta.

- Vai voltar a Paris e trazer para aqui todos os criados que lá ficaram - ordenou. - Necessito de todo o pessoal em Auteuil.

- Mas não ficará ninguém na casa, Sr. Conde? -perguntou Baptistin.

- Sim, ficará o porteiro.

- O Sr. Conde não se esqueça de que do cubículo à casa ainda é longe...

- E então?

- Então, poderiam roubar toda a casa sem que ele ouvisse o mais pequeno ruído.

- Quem?

- Quem?... Os ladrões!

- É muito simplório, Sr. Baptistin. Se os ladrões me roubassem toda a casa nunca me ocasionariam a contrariedade que me ocasionaria um serviço mal feito.

Baptistin inclinou-se.

- Como lhe disse - prosseguiu o conde -, traga todos os seus colegas, do primeiro ao último. Mas que tudo fique no estado habitual. Feche apenas as persianas do rés-do-chão; mais nada.

- E as do primeiro andar?

- Bem sabe que nunca se fecham. Vá.

O conde informou que jantaria sozinho nos seus aposentos e que só queria ser servido por Ali.

Jantou com a sua tranquilidade e sobriedade habituais e depois do jantar fez sinal a Ali para o acompanhar, saiu pela portinha, alcançou o Bosque de Bolonha como se passeasse, tomou sem afectação o caminho de Paris e ao cair da noite encontrou-se diante da sua casa nos Campos Elísios.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069