- Ah, é justo! - exclamou Luís XVIII, sorrindo de maneira que demonstrava que todas estas perguntas reiteradas não tinham sido feitas sem intenção. - Esquecia-me de que o senhor não está de boas relações com o Sr. Noirtier. Trata-se de um novo sacrifício feito à causa monárquica de que devo recompensá-lo.
- Sire, a bondade que Vossa Majestade me testemunha é recompensa que ultrapassa tanto todas as minhas ambições que não tenho mais nada a pedir ao rei
- Não importa, senhor, e não o esqueceremos, esteja tranquilo. Entretanto - o rei tirou a cruz da Legião de Honra que usava habitualmente na casaca azul, junto da cruz de S. Luís e por cima da placa da Ordem de Nossa Senhora do Monte Carmelo e de S. Lázaro e entregou-a a Villefort -, entretanto tome esta cruz.
- Sire - observou Villefort -, Vossa Majestade engana-se, essa cruz é a de oficial.
- É verdade, senhor - disse Luís XVIII -, mas mesmo assim aceite-a. Não tenho tempo para mandar vir outra. Blacas, não se esqueça de providenciar para que seja passado o alvará ao Sr. de Villefort
Os olhos de Villefort cobriram-se de lágrimas de orgulhosa alegria. Pegou na cruz e beijou-a.
- E agora - perguntou - quais são as ordens que me faz a honra de me dar Vossa Majestade?
- Descanse o tempo que precisar e lembre-se de que sem força em Paris para me servir me poderá ser da maior utilidade em Marselha.
- Sire - respondeu Villefort inclinando-se -, deixarei Paris dentro de uma hora.
- Vá, senhor - disse o rei -, e se o esquecer (a memória dos reis é curta) não receie fazer-se-me lembrado... Sr. Barão, mande procurar o ministro da Querra. Blacas, fique.
- Ah, senhor - disse o ministro da Polícia a Villefort à saída das Tulherias -, entrou com o pé direito, tem a sua fortuna feita! - Por muito tempo? - murmurou Villefort, despedindo-se do ministro, cuja carreira terminara, e procurando com a vista uma carruagem para regressar a casa.
Passava um fiacre no cais. Villefort fez-lhe sinal e o fiacre aproximou-se. Villefort deu o seu endereço, atirou-se para o fundo da carruagem e deu largas aos seus sonhos de ambição.
Dez minutos depois estava em casa. Mandou preparar os cavalos para dali a duas horas e ordenou que lhe servissem o pequeno-almoço.
Ia sentar-se à mesa quando a campainha da porta da rua tocou, acionada por uma mão franca e firme. O criado de quarto foi abrir e Villefort ouviu uma voz pronunciar o seu nome.
«Quem poderá já saber que estou cá?», interrogou-se o jovem.
Neste momento o criado de quarto voltou a entrar.
- Então - perguntou Villefort -, quem era? Quem tocou? Quem procura por mim?
- Um desconhecido que não quer dizer o seu nome.