O Conde de Monte Cristo - Cap. 86: O julgamento Pág. 829 / 1080

- O Sr. de Morcerf - continuou Beauchamp - olhava a mulher com uma surpresa laivada de terror. Para ele, era a vida ou a morte que ia sair daquela boca encantadora; para todos os outros, era uma aventura tão estranha e cheia de curiosidade que a salvação ou a perda do Sr. de Morcerf já só entrava no acontecimento como elemento secundário.

»O presidente ofereceu com um gesto de mão uma cadeira à jovem, mas ela fez sinal com a cabeça que ficaria de pé.

»Quanto ao conde, deixara-se cair na sua poltrona e era evidente que as pernas se recusavam a sustentá-lo.

»- Minha senhora - disse o presidente -, escreveu à comissão para lhe dar informações acerca do caso de Janina, e adiantou que fora testemunha ocular dos acontecimentos.

»- Fui-o, com efeito - respondeu a desconhecida numa voz cheia de encantadora tristeza e dessa sonoridade característica das vozes orientais.

»- No entanto - prosseguiu o presidente -, permita-me que lhe diga que devia ser muito nova então.

»- Tinha quatro anos. Mas como os acontecimentos se revestiam para mim de suprema importância, nem um pormenor saiu do meu espírito, nem uma particularidade escapou da minha memória.

»- Mas que importância tinham para si esses acontecimentos e quem é a senhora, para que essa grande catástrofe lhe tenha causado tão profunda impressão?

»- Tratava-se da vida ou da morte do meu pai - respondeu a jovem - e chamo-me Haydée, filha de Ali-Tebelin, paxá de Janina e de Vasiliki; sua esposa bem-amada.

»O rubor, ao mesmo tempo modesto e orgulhoso, que cobriu as faces da jovem, o fogo do seu olhar e a majestade da sua revelação produziram na assembleia um efeito inexprimível.

»Quanto ao conde, não ficaria mais aniquilado se um raio lhe tivesse aberto um abismo aos pés.

»- Minha senhora - prosseguiu o presidente, depois de se inclinar com respeito -, permita-me uma simples pergunta, que não é uma dúvida, e que será a última: pode confirmar a autenticidade do que disse?

»- Posso, senhor - respondeu Haydée, tirando debaixo do véu uma bolsinha de cetim perfumado. - Aqui está a minha certidão de nascimento, redigida por meu pai e assinada pelos seus principais oficiais, bem como a minha certidão de baptismo, pois meu pai consentiu que fosse educada na religião da minha mãe, certidão que o grande primaz da Macedónia e do Epiro autenticou com o seu selo, e finalmente (e isto é o mais importante, sem dúvida) o registo da venda da minha pessoa e da pessoa da minha mãe ao negociante arménio El-Kobbir pelo oficial francês que, no seu infame negócio com a Porta, reservara para si, como parte na pilhagem, a filha e a mulher do seu benfeitor, que vendeu por mil bolsas, isto é, por cerca de quatrocentos mil francos.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069