A Queda de um Anjo - Cap. 30: Capítulo 30 Pág. 167 / 207

— E vossemecê não lhe disse que viesse para sua casa?

— Ora se disse! chamou-me parvo e asno. Asno a mim, fidalga! Eu acomodei-me, porque não quero testilhas com doidos. Afinal, eu estava a ver quando me empurrava pela porta fora! Aqui tem o que há a tal respeito. Sirva-lhe de governo, Sra. morgada. Agora, faça por ter mão na manta. A casa é grande; mas tem-se visto acabarem-se casas maiores. O que a fidalga deve fazer é não deixar ir pela água abaixo o seu património. Aguente-se.

— Não, que eu vou a Lisboa! — exclamou ela batendo o pé, e vibrando murros contra o ar. — Vou a Lisboa, e faço lá o diabo!… Então a tal mulher está numa serra? Vossemecê disse que ela estava numa serra?…

— É serra; mas a terra é bonita. Há por lá árvores do começo do mundo, e cada pedaço de jardim que dava trezentos alqueires de centeio. Chama-se Sintra, está lá o rei e a fidalguia.

— Pois vou lá, que o meu homem é meu — vociferou ela, voz em grita. — Se ele não quiser vir para casa, vou falar ao rei e aos governos.

— Fidalga, pense bem no que faz, e ouça o que lhe diz o senhor seu primo Lopo de Gamboa, que sabe mais do que eu. Daqui me vou a ver a minha gente, e até amanhã, fidalga.

Doida de aflição, a traída esposa mandou logo um criado à casa da Verdoeira chamar o primo Lopo de Gamboa.

Este Lopo, bacharel em Direito, homem de trinta e tantos anos, e sagaz até à protérvia, vivia na companhia do irmão morgado, comendo o rendimento da sua escassa legítima de filho segundo.





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