Desde então, Calisto Elói não bebeu senão vinho e melhorou da garganta e do espírito, um tanto quebrantado, recitando, a cada garrafa que abria, o provérbio da sagrada escritura: — Vinum bonum loetificat cor hominis.
Não obstante, o descrédito do seu clássico deveras lhe doeu, mormente pelo tom de mofa com que o cirurgião enxovalhou as cãs do honrado e lusitaníssimo escritor Luís Mendes.
Apenas convalescido, Calisto abriu outro livro da mesma idade, escrito por idêntico motivo, para averiguar se o autor do Sítio de Lisboa claudicara como patranheiro em matéria de chafarizes.
O bacamarte consultado era a Fundação, Antiguidades e Grandezas da muita insigne Cidade de Lisboa, etc., escrito pelo capitão Luís Marinho de Azevedo.
— Cá está! — exclamou Barbuda em solilóquio — cá está explicada a minha dor de barriga! era destemperança no fígado.
O deputado acabava de ler o seguinte período de Luís Marinho:
«Encareceu Plínio muito a água, que vinha a Roma da fonte
Márcia, e Vitrúvio e das fontes Camenas, porque nasciam quentes e eram saborosas no gosto, sendo por esta causa muito sadias e proveitosas para conservar saúde. E posto que (hic) Luís Mendes de Vasconcelos queira que por estas propriedades tenha a água do chafariz de El-Rei as mesmas qualidades, a experiência mostra que, sendo suave no gosto, o não é nos efeitos, porque lhe atribuem os médicos a destemperança do fígado, que muitas pessoas padecem, e de que procedem várias enfermidades.»