Não sentirás em volta de ti no teu enterro cantos em mau latim, o som das campainhas, a voz aguda dos meninos do côro, os comentários estúpidos da multidão, as grosseiras enxadadas do coveiro. Serás lançada à tua cova do mar no meio de um silêncio militar, levando por mortalha a bandeira inglesa, ao cantochão infinito dos ventos e das águas.
Não ficarás para sempre apertada em cinco palmos de terra, sentindo a boca das raízes pastar o teu seio e a multidão dos vermes entrar no teu corpo como numa cidadela vencida. Não! a tua morte será uma perpétua viagem: viverás nas grutas transparentes de luz, guardarás os tesouros misteriosos, visitarás as cidades de coral que luzem no fundo do mar, amarás o corpo encantado de algum louro príncipe, outrora pirata normando! Andarás dispersa no elemento, sombra infinita, alma da água!
Sobre o teu túmulo não virão sentar-se os burgueses, benzer-se os sacristães, cacarejar as galinhas; sobre a tua azul sepultura errará o vento, melancólico velho que visita os seus mortos.
Não terás um epitáfio metrificado por um poeta elegíaco, e aprovado pela camara municipal; serão os reflexos inefáveis das estrelas que se encruzarão para formar sobre a tua sepultura as letras do teu nome…
Um marinheiro bateu-me no ombro.
- São 11 horas, disse ele.
Ergui-me em sobressalto, e pensando nas vãs quimeras que se tinham estado formando no meu cérebro naquele triste cismar, disse comigo:
- Pobre de mim! Tinham-me esquecido os tubarões.
Eram 11 da noite. Não havia estrelas. Todos estavam reunidos na tolda.
Tinham-se posto lanternas nas cordagens, e acendido archotes.
Dois marinheiros tomaram o cadáver nos braços. O padre abençoou-o. Ligou-se-lhe ao corpo com uma corda a bandeira inglesa.