O homem rubicundo teria consolado a sua vítima com chalaças. o outro nem sequer lhe teria sorrido.
O primeiro dos seus quarenta e cinco anos, devia gostar de boa mesa e de mulheres. Esses homens têm todos paixões que os tornam escravos do seu mister. Mas o mais novo não tinha paixões nem vícios. Se era espião pertencia à diplomacia. e trabalhava por pura arte. Concebia, o outro executava era a ideia, o outro, a forma.
- Devemos estar, em GondrevilIe. boa mulher? - perguntou o jovem.
- Aqui não se costuma dizer boa mulher - respondeu Michu. - Temos ainda a simplicidade de nos chamarmos cidadã e cidadão, nós, pelo menos.
- Ah! - suspirou o mais novo com a maior naturalidade e sem parecer chocado.
Há jogadores, muitas vezes, na sociedade, sobretudo quando jogam o écarté, que experimentam como que uma derrota interior ao verem sentar-se diante deles, estando a ganhar, outro jogador cujos modos, cujos olhares, cuja voz, cuja maneira de baralhar as cartas lhes predizem uma derrota.
Diante do aspecto daquele moço, Michu sentiu uma prostração profética do mesmo género. Um pressentimento mortal o atingiu pois entreviu, confusamente o cadafalso; uma voz lhe gritou que aquele moscadim lhe seria fatal, embora entre eles não houvesse ainda absolutamente nada de comum. Por isso a sua resposta fora rude pois queria ser e foi grosseiro.
- Não pertencerá. porventura. ao conselheiro de Estado Malin? - perguntou o segundo parisiense.
- Eu sou senhor de mim mesmo - respondeu Michu.
- Enfim, minhas senhoras - disse o mais jovem, arrogando-se os modos mais corteses -, estamos ou não estamos em Gondreville? O Senhor Malin espera aí por nós.
- Aqui tem o parque - tornou-lhe Michu, mostrando o portão aberto.