Um Caso Tenebroso - Cap. 5: V – LAURENCE DE CINQ-CYGNE Pág. 47 / 249

A despesa global de Cinq-Cygne não ia além de cinco mil francos por ano. Mas Laurence, que não se preocupava com detalhes, achava tudo bem. O tutor e a esposa, insensivelmente dominados pela influência imperceptível deste carácter que se manifestava nas mais pequenas coisas, haviam acabado por- admirar aquela a quem tinham conhecido criança, sentimento muito mais raro do que se supõe. Mas a verdade é que nas suas maneiras, na sua voz gutural, no seu olhar imperioso, Laurence tinha esse não se sabe bem o quê, poder inexplicável que se impõe sempre, mesmo quando apenas aparente, pois o certo é que, nos tolos, o vazio parece-se muito com a profundeza. Para as pessoas vulgares, a profundeza é incompreensível.

Daí provém, talvez, a admiração do povo por tudo que não compreende.

O Senhor e a Senhora de Hauteserre, dominados pelo seu silêncio habitual e impressionados pela selvajaria da jovem condessa, estavam sempre à espera de alguma coisa de grande da parte dela. Praticando o bem com discernimento e sem se deixar ludibriar, Laurence conseguia ser respeitada em alto grau pelos camponeses, embora aristocrata. O seu sexo, o seu nome, as suas desditas, a originalidade da sua vida, tudo concorria para lhe dar autoridade sobre os habitantes do vale de Cinq-Cygne. Às vezes estava fora de casa um ou dois dias, na companhia de Gothard; e nunca, no seu regresso, o Senhor ou a Senhora de Hauteserre lhe faziam qualquer pergunta sobre os motivos da sua ausência. Note-se que Laurence não tinha em si própria nada de estranho. O virago ocultava-se nela sob a forma mais feminina e de mais frágil aparência. Tendo um, coração de uma sensibilidade excessiva, trazia na cabeça uma resolução viril e uma firmeza estóica. Os seus olhos clarividentes não sabiam chorar.





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