O Conde de Monte Cristo - Cap. 85: A viagem Pág. 819 / 1080

Passaram todo o dia entregues aos mais diversos exercícios, nos quais, aliás Monte-Cristo era excelente: mataram uma dúzia de faisões no parque, pescaram outras tantas trutas nos regatos, almoçaram num quiosque sobre o mar e serviram-lhes o chá na biblioteca.

Quase à noitinha do terceiro dia, Albert, quebrado de fadiga por aquela vida intensa, que parecia ser uma brincadeira para Monte-Cristo, dormia junto da janela enquanto o conde fazia com o seu arquitecto a planta de uma estufa que queria instalar em casa, quando o ruído de um cavalo nas pedras da estrada fez o rapaz erguer a cabeça. Olhou pela janela e, com uma surpresa das mais desagradáveis, viu no pátio o seu criado de quarto, de que não quisera fazer-se acompanhar para incomodar menos Monte-Cristo.

- Florentin aqui! - exclamou, saltando da poltrona. - Estará a minha mãe doente?

E precipitou-se para a porta do quarto.

Monte-Cristo seguiu-o com os olhos e viu-o chegar junto do criado, que, ainda esbaforido, tirou da algibeira um pacotinho selado que continha um jornal e uma carta.

- De quem é esta carta? - perguntou vivamente Albert.

- Do Sr. Beauchamp - respondeu Florentin.

- Foi Beauchamp que te enviou, então?

- Foi, sim, senhor. Chamou-me a sua casa, deu-me o dinheiro necessário para a viagem, arranjou-me um cavalo de posta e obrigou-me a prometer que não pararia enquanto não encontrasse o senhor. Fiz a viagem em quinze horas.

Albert abriu a carta a tremer. Logo que leu as primeiras linhas, soltou um grito e pegou no jornal a tremer visivelmente.

De súbito, os olhos nublaram-se-lhe, as pernas pareceram faltar-lhe, e, prestes a cair, apoiou-se em Florentin, que estendeu o braço para o amparar.

- Pobre rapaz! - murmurou Monte-Cristo, tão baixo que ele próprio não conseguiu ouvir as palavras de compaixão que pronunciara. - Mas Ele disse que os pecados dos pais recairão sobre os filhos até à terceira e quarta geração...

Entretanto, Albert recuperara forças e continuara a ler. Por fim, sacudiu os cabelos da testa coberta de suor, amarrotou a carta e o jornal e perguntou:

- Florentin, o teu cavalo está em condições de voltar a Paris?

- Além de ser um mau garrano de posta, está coxo.

- Oh, meu Deus! E como estava a casa quando a deixaste?

- Bastante calma. Mas quando voltei de casa do Sr. Beauchamp encontrei a senhora a chorar. Ela mandara-me chamar para saber quando o senhor voltaria. Então disse-lhe que ia procurá-lo da parte do Sr. Beauchamp. O seu primeiro movimento foi estender os braços, como que para me deter, mas, depois de um instante de reflexão, disse-me: «Está bem, Florentin, ele que volte.»

- Sim, minha mãe, sim - disse Albert -, volto, pode estar tranquila, e ai do infame!... Mas antes de mais nada tenho de partir.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069