O Mistério da Estrada de Sintra - Cap. 25: CAPÍTULO XIII Pág. 140 / 245

Não teve uma queixa, uma saudade, um desdém. As últimas palavras da sua vida eram dignas. Depois tirou um rosário do seio.

- Veio de Jerusalém, disse-me, dê-lho a ela.

Eu tinha os olhos humedecidos, Carmen, entretanto, empalidecia terrivelmente.

- Levem-me para cima, quero ver o mar, quero ver a luz.

Era uma manhã nebulosa e triste. O mar estava mais sereno. Colocámos Carmen cuidadosamente sobre almofadas e mantas, voltada para Malta. Lá tinha ficado a sua vida. Esteve muito tempo calada, com as mãos cruzadas.

- Que terra é aquela? perguntou mostrando com a mão tremula, uma linha escura no horizonte.

- A Africa, respondeu lord Grenlei.

Ela ficou olhando vagamente:

- Fui uma vez a Tanger, disse com uma voz lenta, era nova então! Era feliz! Estava um dia lindo… Era em maio…

Calou-se. E voltando-se para mim:

- Faz agora meses que passámos nesta altura, lembra-se? E aquele punch a bordo do Ceilão? Quando eu cantei uma habanera! Eu cantava então… O que é ser alegre! Tudo acabou, nunca mais! nunca mais!

E como falando consigo mesma:

- Tanta paixão, tanta inquietação! E aqui está: venho morrer só, no meio deste mar. Pobre de mim! E no fim, se eu em nova, em solteira, o tivesse encontrado, a ele… Eu pedia pouco então: um coração leal. Tive gostos simples sempre. As loucuras vieram depois… O marinheiro que canta as arias escocesas, onde está? Chamem-no. Não, não o chamem que me vai fazer chorar.

Nós escutávamo-la; a sua alma falava como um pássaro canta ao morrer. As nuvens desfaziam-se, o azul aclarava, ia aparecer o sol.

- Vejam isto, continuou ela. Em nova diziam-me és bonita, amo-te! E agora que morro aqui, quem se lembra de mim? Os que me conheceram onde estão? Uns mortos, todos esquecidos. Estão agora alegres, amam outras, vão para os teatros.





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