Emmanuel arrancar-me-ia a arma das mãos e encheria a casa com os seus gritos. O senhor, conde, de quem tenho a palavra, o senhor, que é mais do que um homem, o senhor, a quem chamaria um deus se não fosse mortal, o senhor conduzir-me-á suave e ternamente até às portas da morte, não é verdade?
- Meu amigo - disse o conde -, ainda me resta uma dúvida: teria tão pouca coragem que fosse capaz de recorrer ao orgulho para exibir a sua dor?
- Não, veja, sou sincero - respondeu Morrel, estendendo a mão ao conde -, e o meu pulso não bate nem mais depressa nem mais devagar do que de costume. Não, sinto-me no fim do caminho; não, não irei mais longe. Disse-me que esperasse e tivesse esperança; sabe o que fez, pobre sábio que é? Esperei um mês, isto é, sofri um mês! Tive esperança (o homem é uma pobre e miserável criatura), mas esperança em quê? Não sei, em algo desconhecido, absurdo, insensato! Num milagre... mas em qual? Só Deus o pode dizer, ele que juntou à nossa razão essa loucura chamada esperança. Sim, esperei; sim, tive esperança, conde, e desde que falamos, há um quarto de hora, o senhor, sem o saber, torturou-me, dilacerou-me cem vezes o coração, porque cada uma das suas palavras provou-me que já não existe esperança para mim. Ó conde, como repousarei doce e voluptuosamente na morte!
Morrel pronunciou as últimas palavras com uma explosão de energia que fez estremecer o conde.
- Meu amigo - continuou Morrel, vendo que o conde se calava -, indicou-me o dia 5 de Outubro como termo do prazo que me pediu... Meu amigo, é hoje o dia 5 de Outubro...
Morrel puxou do relógio.
- São nove horas, ainda tenho três horas de vida.
- Seja - respondeu Monte-Cristo. - Venha.
Morrel seguiu maquinalmente o conde. Estavam já na gruta mas Maximilien ainda não dera por isso.
Encontrou tapetes debaixo dos pés; uma porta abriu-se, sentiu-se envolto em perfumes e uma luz viva feriu-lhe os olhos.
Morrel parou, hesitou em avançar; desconfiava das delícias excitantes que o rodeavam.
Monte-Cristo puxou-o suavemente.
- Não será melhor empregarmos as três horas que nos restam como os antigos romanos, que, condenados por Nero, seu imperador e seu herdeiro, se sentavam à mesa coroados de flores e aspiravam a morte com o perfume dos heliotrópios e das rosas?
Morrel sorriu.
- Como queira - disse. - A morte é sempre a morte, isto é, o esquecimento; isto é, o repouso; isto é, a ausência da vida e por conseguinte da dor.