Os Brilhantes do Brasileiro - Cap. 14: XIV - Via dolorosa Pág. 71 / 174

E longe de nós acoimar de aviltamento a humilhação da filha; se, no entanto, o sentir filial a não impulsa, e a cobiça, fingindo arrependimento, se deplora, o senhoril do ato é pouquíssimo exemplar. Tanto assim, que Ângela, despreocupada do desejo de enriquecer-se para remediar alheios infortúnios, certo se deixaria vencer da fome antes de ajoelhar a um homem distinto dos outros pelo nome insignificativo de pai.

Foi, pois, caminho de Ponte de Lima, apenas saiu do convento. Chegou de noite com Vitorina ao portão do palacete. Bateu, esperou largo tempo que lhe abrissem. Anunciou-se. Mandou-a entrar um antigo criado; conduziu-a a uma sala, com duas alcovas, dizendo-lhe:

- Vossa excelência tem ali uma cama naquela alcova, e a criada outra. Eu vou servir o chá.

- E meu pai não me consente que o veja hoje? - perguntou Ângela.

- Seu pai, minha senhora, foi para França há quinze dias consultar médicos, por que tem padecido muito nestes últimos meses. Eu já era criado em Gondar quando vossa excelência nasceu. A Sr.ª. Vitorina há de lembrar-se do João Pedro. Sou eu, é este velho que aqui está. Ora eu fiquei com o governo desta casa, que para isso fui chamado lá do Paço, e entendo que minha obrigação é receber a filha do meu amo, e dar parte para Paris que vossa excelência está aqui. Se o Sr. general reprovar o meu procedimento, e me despedir do seu serviço, já me não prega grande peça, que eu pouco hei de viver. Até já, minha senhora. Se a Sr.ª. Vitorina quisesse ajudar-me a preparar o chá, bom seria, para não haver grande demora; que eu despedi a cozinheira assim que o patrão saiu, e cá me arranjo e mais outro criado com duas brasas e um púcaro.

Era consolador o repousar e respirar que Ângela experimentava naquela atmosfera de riqueza.





Os capítulos deste livro