O Mistério da Estrada de Sintra - Cap. 3: CAPÍTULO II Pág. 12 / 245

Com quanto estas coisas fossem ditas por F… com um ar de bondade risonha, o nosso interlocutor parecia irritar-se progressivamente ao ouvi-lo. Movia convulsivamente uma perna, firmando o cotovelo num joelho, pousando a barba nos dedos, fitando de perto o meu amigo. Depois, reclinando-se para traz e como se mudasse de resolução:

- No fim de contas, a verdade é que tem razão e talvez eu fizesse e dissesse o mesmo no seu lugar.

E, tendo meditado um momento, continuou:

- Que diriam porém os senhores se eu lhes provasse que esta mascara em que querem ver apenas um sintoma burlesco é em vez disso a confirmação da seriedade do caso que nos trouxe aqui?… Queiram imaginar por um momento um desses romances como há muitos: Uma senhora casada, por exemplo, cujo marido viaja há um ano. Esta senhora, conhecida na sociedade de Lisboa, está gravida. Que deliberação há de tomar?

Houve um silêncio.

Eu aproveitei a pequena pausa que se seguiu ao enunciado um tanto rude daquele problema e respondi:

- Enviar ao marido uma escritura de separação em regra. Depois, se é rica, ir com o amante para a América ou para a Suíça; se é pobre, comprar uma máquina de costura e trabalhar para fora numa água furtada. É o destino para as pobres e para as ricas. De resto, em toda a parte se morre depressa nessas condições, num cottage à beira do lago Genebra ou num quarto de oito tostões ao mês na rua dos Vinagres. Morre-se igualmente, de tisica ou de tédio, no esfalfamento do trabalho ou no enjoo do idílio.

- E o filho?

- O filho, desde que está fora da família e fora da lei, é um desgraçado cujo infortúnio provém em grande parte da sociedade que ainda não soube definir a responsabilidade do pai clandestino. Se os pais fazem como a legislação, e mandam buscar gente à estrada de Sintra para perguntar o que se há de fazer, o melhor para o filho é deita-lo à roda.





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