O Mistério da Estrada de Sintra - Cap. 11: CAPÍTULO II Pág. 58 / 245

vai senão quando, à segunda noite que passavam cá, acordam aos gritos da criança. Tinha-se apagado a luz. Acenderam-na a toda a pressa. A porta do quarto estava fechada por dentro. Os fechos das janelas achavam-se corridos. No quarto não havia mais ninguém. Mas a roupa da cama da criança estava caída a dois ou três passos de distância do berço em que ela dormia, e a pequenita, nua, transida de medo, branca como o travesseiro e tremendo como varas verdes, disse, quando lhe chegou a fala que teve perdida por um bocado, que sentira umas coisas como os pés de uma galinha muito grande que se lhe pousavam na cama; que se achara depois descoberta e ouvira umas coisas suspiradas envoltas em soluços e beijos, mimos que metiam medo e que ela não entendia, enquanto um peito coberto de penas se lhe roçava pelo seio nu. A mãe então vestiu-lhe à pressa uns fatinhos, embrulhou-a num xaile, estreitou-a nos braços, pôs-se a dar-lhe beijos e acalenta-la com o bafo, e saiu para a rua aterrada e como doida. O homem, que era valente e destemido, correu a casa toda com luz e sem luz, metendo-se por todos os cantos e recantos, rangendo os dentes e picando as paredes enfurecido com uma faca de ponta que levava em punho. Não apareceu ninguém! Ninguém podia ter saído! Ninguém podia ter entrado! No dia seguinte foi levar a chave do prédio ao senhorio, dizendo-lhe que se algum dia tivesse dinheiro lhe compraria esta casa para ele mesmo a deitar abaixo com um picão e a machado, para lançar o fogo a quanto pudesse arder, e calcar depois aos pés e salgar o monte de cinzas que ficasse no chão.

- Pois senhor, eu nenhuma dessas coisas tenho ouvido, e é esta a segunda noite que durmo aqui.

- Gabo-lhe o gosto! E não tem medo?

- Nenhum.

- Por isso por aí dizem do senhor o que dizem!

- Então que dizem por aí de mim?

- Dizem, com o devido respeito, que o senhor é um alemão da Moirama e que tem partes com o demónio.





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