O Mistério da Estrada de Sintra - Cap. 16: CAPÍTULO IV Pág. 96 / 245

Era destemido, meio louco, cantava estranhas melodias do Indostão, adorava o Ganges, e dormia sempre em cima de uma palmeira.

Nós levávamos espingardas excelentes, punhais recurvados, espadas de dois gumes, curtas, à maneira dos gládios romanos, e o terrível tridente de ferro que é a melhor arma para a luta com o tigre. Ia uma matilha de cães, forte e dextra, da confiança dos malaios.

Ás 11 horas do dia penetrávamos em plena floresta. O tigre devia ser encontrado numa clareira conhecida. Íamos calados, vergando ao peso implacável do sol, entre palmeiras, tamarindos, espessuras profundas, num ar sufocado, cheio de aromas acres. Toda aquela natureza estava entorpecida pela calma: os pássaros, silenciosos, tinham um vôo pesado; as suas penas coloridas, vermelhas, negras, roxas, doiradas, resplandeciam, sobre o verde negro da folhagem. O céu mostrava uma cor de cobre ardente; os cavalos marchavam com o pescoço pendente; os cães arquejavam; o boi que levava a água mugia lamentavelmente; só o elefante caminhava na sua pompa impassível, em quanto os malaios para esquecer a fadiga, diziam, com a voz monótona e lenta, cantigas de Bombaim.

Estávamos ainda distantes do tigre: nem os cavalos tinham rinchado, nem o elefante soltara o seu grito melancólico e doce. Todavia achávamo-nos próximo da clareira.

Eu cheguei ao palanquim de Carmen e bati nas cortinas. Carmen entreabriu-as: estava pálida da fadiga do sol e do prazer do perigo; os olhos reluziam-lhe extraordinariamente. Ansiava pela luta, pelos tiros, pelo encontro da fera. Pediu-me uma cigarrete e um pouco de cognac e água…

Eu desde que a conhecia tinha muitas vezes olhado Carmen com insistência, e tinha visto sempre o seu olhar negro e acariciador envolver-me respondendo ao meu.





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