Quanto à sua vida em qualquer pais era coisa que não o preocupava. Em toda a parte os marinheiros eram raros e falava italiano como um toscano e espanhol como um natural de Castela-a- Velha. Viveria livre e feliz com Mercédès e com o pai, pois o pai também iria ter com ele, ao passo que assim estava prisioneiro, encerrado no Castelo de li, naquela prisão intransponível, sem saber o que era feito do pai nem de Mercédès, e tudo isso porque acreditara na palavra de Villefort. Era de enlouquecer. Por isso, Dantès rebolava-se furioso na palha fresca que lhe trouxera o carcereiro.
No dia seguinte, à mesma hora, o carcereiro voltou.
- Então, está hoje mais razoável do que ontem? - perguntou-lhe.
Dantès não respondeu.
- Que diabo, um pouco de coragem! - insistiu o carcereiro. - Deseja alguma coisa que esteja ao meu alcance? Vamos, diga.
- Desejo falar com o governador.
- O quê? Já lhe disse que é impossível - redarguiu o carcereiro com impaciência.
- Impossível porquê?
- Porque pelos regulamentos da prisão não é permitido aos prisioneiros pedir isso.
- Então, que é permitido aqui? - perguntou Dantès.
- Melhor alimentação, pagando, passear e às vezes livros.
- Não preciso de livros, não tenho nenhuma vontade de passear e acho a minha alimentação boa. Portanto, só quero uma coisa: ver o governador.
- Se continua a repetir-me sempre a mesma coisa, não lhe trago mais de comer - ameaçou-o o carcereiro.
- Se não me trouxeres mais de comer - ripostou Dantès -, morrerei de fome e pronto! O tom em que Dantès proferiu estas palavras provou ao carcereiro que o seu prisioneiro se daria por feliz se morresse.
Por isso, como qualquer prisioneiro rendia, bem feitas as contas, cerca de dez soldos por dia ao seu carcereiro, o de Dantès avaliou o prejuízo que lhe acarretaria tal morte e insistiu em tom mais ameno:
- Ouça, o que deseja é impossível. Portanto, não insista, pois não há exemplo de, a pedido de um prisioneiro, o governador ir à sua cela. Mas se o senhor se portar bem permitir-lhe-ão o passeio e é possível que um dia, enquanto passeia, o governador passe... Então, poderá dirigir-lhe a palavra e se ele lhe quiser responder é lá com ele.
- Mas quanto tempo posso esperar assim sem que esse acaso se verifique? - perguntou Dantès.
- Sei lá! - respondeu o carcereiro. - Um mês, três meses, seismeses, talvez um ano...
- É demasiado - redarguiu Dantès. - Quero vê-lo imediatamente.
- Bom, o melhor é não se entregar assim a um único desejo impossível ou antes de quinze dias estará louco.
- Achas? - perguntou Dantès.
- Sim, louco. é sempre assim que começa a loucura; temos cá um exemplo disso.