Mas esta criança, antes de perfazer dois anos, ficou sem mãe. As janelas do paço de Gondar fecharam-se outra vez. Simão de Noronha desapareceu, enquanto na igreja paroquial se entoavam os responsos à volta da essa de D. Maria. A criança foi levada a Viana, onde vivia casada uma irmã do fidalgo. E o espanto geral dos vizinhos não desistiu de cavar na sepultura da formosa desvairada até descobrir que ela, numa vertigem de ciúme, fora estrangulada. Isto de cavar na campa da morta vem aqui figuradamente. Ninguém profanou a sepultura de D. Maria. O caso execrando soube-se quando um morgado dos Arcos de Valdevez contou aos seus amigos, não sem fatuidade, que Simão de Noronha matara sua prima, instantes depois que encontrara entre moitas de roseiras um punhal com a firma dele revelador, que também era primo. Ora este punhal lhe saltara da algibeira da véstia castelhana, quando o fugitivo pulava da janela ao jardim
Doze anos depois, Simão de Noronha desembarcava no Mindelo com a patente de coronel. Quarenta e seis anos teria: mas representava adiantada velhice.
Finda a guerra e reformado em general, o senhor de Gondar foi viver no seu arruinado palacete de Ponte do Lima, e não voltou à casa solarenga.
De longe a longe, parava à porta do general uma liteira, donde apeava, juntamente com sua criada já idosa, uma menina que contaria entre catorze e dezasseis anos. As pessoas, que tinham conhecido D. Maria d’Antas, decidiram logo que a bela hóspeda do general era filha daquela malograda dama e de Simão de Noronha. De feito, era a criança que treze anos antes havia, talvez, sido arrebatada dos braços de sua mãe pela mão que lhe afogara o nome no sangue da garganta.
Era Ângela.
Demorava-se a hóspede um dia em Ponte do Lima, e voltava com sua criada para Viana, onde residia querida extremosamente da irmã de seu pai.