Sobre as chaminés de mármore havia alguns livros e vasos com flores. Os móveis estavam dispostos de maneira que parecia conversarem baixinho em coisas delicadas e íntimas. Sentia-se que estava ali, domiciliada num aconchego feliz, uma existência espirituosa e contente: percebia-se no ar e no aspeto das coisas, o vago prestígio do perfume, da harmonia, do calor, que as pessoas que aí tivessem estado tinham derramado em volta de si, conversando, lendo, fazendo música. Eu tinha levantado os olhos de um livro sobre a mesa do centro da sala, quando vi em frente de mim, ao fundo de um grande espelho, uma figura imóvel, tétrica, espetral. Voltei-me rapidamente, e não pude reprimir um grito de pasmo e de terror. Era a condessa.
Horrível transformação porque ela passara! Durante as poucas horas que tinham mediado entre esse momento e a última vez que a vira, a condessa de W… tinha envelhecido dez anos. Os olhos profundamente encovados tinham tomado uma expressão apagada e imóvel; a carne tinha uma cor térrea e opaca; os músculos faciais, contraídos na mais violenta opressão, davam-lhe ao rosto, transversalmente vincado por dois sulcos escuros, o aspeto de uma magreza extrema; os cabelos apanhados todos para traz, alisados e seguros num rolo sobre a nuca, avultavam-lhe o nariz afilado e despegavam-lhe do crânio as orelhas lívidas, de uma saliência rija e cadavérica.
Fez-me sinal que a acompanhasse. Segui-a com a sensação enregelada de quem entra nos domínios da morte. Atravessámos uma sala e entrámos num dos quartos dela. Apontou para um sofá e sentou-se ao meu lado, olhando para mim, impassível.
Ficou assim por um momento na mudez de uma dor intraduzível, pausa terrível em que a alma emerge de um abismo de lágrimas e se debate violentamente antes de aparecer na voz.