A cabeça pendeu-lhe inanimada. Desapertei-lhe a gravata. Amparei-o nos braços, e nesse momento senti o volume, a saliência que na sua casaca fazia a carteira. Veio-me a ideia das cartas. Tudo tinha sido pelo desejo de as ler. Tirei-lhe a casaca; era difícil; os seus músculos estavam hirtos. Junto com a carteira havia outros papéis e um maço de notas de banco. Ao toma-los, os papeis e as cartas espalharam-se no chão. Apanhei-as, apertei-as na gravata branca e meti tudo no bolso.
Isto tinha sido feito convulsivamente, inconscientemente. Dei com os olhos em Ritmel. Pela primeira vez via contração mortal do seu rosto. Chamei-o, falei-lhe! Estava frenética! Porque não queria ele acordar? Empurrei-o, irritei-me com ele. Porque estava assim, porque me fazia chorar? Tinha vontade de lhe bater, de lhe fazer mal.
- Acorda! acorda!
Insensível! Insensível! Morto! Ouvi passar na rua um carro. Havia pois alguém vivo!
De repente, não sei por que, lembrei-me que tinha esvaziado o frasco!
Deviam ser só duas gotas! Estava morto!
Gritei:
- Bety! Bety!
Ela apareceu, arremessei-me aos seus braços. Chorei. Voltei para junto dele. Ajoelhei. Chamei-o. Quis dar-lhe um beijo: toquei-lhe com os lábios na testa. Estava gelada. Dei um grito. Tive horror dele. Tive medo do seu rosto lívido, das suas mãos geladas!
- Bety, Bety, fujamos!
Consciência, vontade, raciocínio, pudor, perdi tudo aos pedaços. Tinha medo, somente medo, um medo trivial, vil!
- Fujamos! Fujamos!
Não sei como saí.
Fora da porta vi ao longe, no começo da rua, uma luz caminhar! caminhava, crescia! Havia alguém, vestido de vermelho, que a trazia! Parecia-me ser sangue! A luz crescia. Esperei, a tremer. Aquilo caminhava para mim. Aproximava-se! Eu estava encostada à porta, na sombra, fria de pedra.