O Mistério da Estrada de Sintra - Cap. 12: CAPÍTULO III Pág. 71 / 245

Logo, o mascarado que conduziu F… ao quarto em que ele se acha preso, é efetivamente um amigo dele, íntimo e particular.

Posso eu, sem semear remorsos que mais tarde entenebrecerão talvez a minha vida com uma sombra eterna, denunciar à polícia uma particularidade, um nome, uma circunstância positiva, que a ponha no encalço deste crime e no descobrimento das pessoas, inocentes ou culpadas, que circulam fatalmente em torno dele?

As mesmas noticias que lhe tenho dado, as cartas que precipitadamente comecei a escrever-lhe, e que hoje, posto que acobertado pelo anonimo, me vejo na obrigação moral de concluir e desenlaçar, não serão já perante a severidade incorruptível, despreocupada e fria dos homens de bem, uma traição aos imprescritíveis deveres da amizade, um agravo à inviolabilidade do sigilo, uma ofensa a esse culto íntimo que se baseia na delicadeza, no melindre,

no primor, - culto que para as almas honradas constitui uma parte dos princípios supremos da primeira das religiões - a religião do carater?

Mas podia também calar-me? ficar mudo, impassível, inerte, neutro, diante deste sucesso obscuro mas tremendo? Podia acaso aceitar na impassibilidade e no silêncio a responsabilidade terrível de um homicídio tenebroso, do qual sou eu a única testemunha com iniciativa, com liberdade, com faculdade de ação?…

Decidam-no as pessoas que por um momento quiserem imaginar-se nas circunstâncias excecionais e únicas em que eu estou.

Na onda de conjeturas, de planos, de determinações, de obstáculos em que me achei envolvido, assoberbado, só, escondido, inquieto, nervoso, sem um único momento que perder, uma só coisa me ocorreu, possível, clara, solvente: publicar anonimamente o que me sucedera, entregar por este modo à sociedade a história da minha situação e esperar dos outros, do público, a solução do problema que eu não sabia resolver por mim.





Os capítulos deste livro