e honrado, e não é fácil enganar-se por este modo, depois de uma provação suprema e definitiva como aquela em que nos achámos, um homem com a minha experiencia do mundo e a minha pratica dos fingimentos humanos. Estas são, senhor redator, as principais considerações que do princípio logo me impediram de tornar público o nome do meu amigo violentamente retido em carcere privado. F… é um homem conhecido, é quase um homem célebre; em Lisboa ninguém há que não conheça o seu nome entre os escritores mais aplaudidos, ninguém que não distinga a sua figura altiva, esmerada, picante, entre os vultos extremamente uniformes dos passeios, das salas e dos teatros.
Se eu comunicasse à polícia o desaparecimento do meu amigo, é quase seguro que ela encontraria meio de o descobrir. Mas não equivaleria isto a denunciar simultaneamente como criminosos o mascarado alto e os seus companheiros que eu todavia considero inocentes?
A carta de F…, apesar da revelação que encerra sobre o desaparecimento das 2:300 libras, confirma por outro lado a convicção em que eu me acho.
Na carta de F… encontra-se o seguinte período:
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«Ocorreu-me que teria um meio de desenganar-me se era efetivamente ou se não era um amigo íntimo que eu tinha ao meu lado: arrancar-lhe o relógio: bastar-me-ia apalpa-lo, ainda vendado como eu estava, para reconhecer o dono. A ser o individuo que eu supunha, a caixa do relógio teria a lisura do esmalte e no centro a saliência de um brasão.»
Ora o relógio a que nestas linhas se alude, se bem lembrado está, é exatamente o mesmo que descrevi na segunda carta que enviei a esse periódico, o mesmo que usava o mascarado que ia sentado em frente de mim na carruagem, e que eu lhe vi por algum tempo fora da algibeira do colete, suspenso na corrente.