Calafrio - Cap. 24: Capítulo 24 Pág. 153 / 164

— Exactamente. Queria que me contasse tudo o que vai dentro dessa cabecinha. .

— E foi por isso que ficou?

Falava com uma alegria tal que só muito a custo consegui encontrar ali alguns resquícios de ressentida paixão; mas nem posso expressar o efeito que teve sobre mim essa vaga implicação de uma rendição. Era como se, ao estai prestes a obter o que tanto ansiava, não pudesse acreditar na minha sorte.

— Bom, acho que posso ser honesta consigo. Foi exactamente por isso que fiquei.

O silêncio que se seguiu foi de tal forma prolongado que pensei que ele se preparava para repudiar o pressuposto em que os meus actos se baseavam. Contudo, aquilo que ele acabou por dizer foi um simples:

— Aqui? Agora?

— Não podia haver melhor altura ou lugar. — O garoto olhou em seu redor de um modo tão apreensivo que fiquei com a rara e a estranha impressão de ver nele o primeiro sintoma de medo. Era como se, de um momento para o outro, o rapaz estivesse com medo de mim, o que me levou a concluir que aquela talvez fosse a melhor via a seguir. Ainda assim senti que seria vão demonstrar dureza, e, com uma doçura que me pareceu quase grotesca, ouvi-me dizer:

— Não me diga que está a pensar em ir dar mais um passeio?

— Exactamente! — Brindou-me com um sorriso heróico, e a bravura desse gesto foi realçada pela dor que se lhe via no rosto. Ele já pegara no chapéu, que tinha trazido para dentro, e pôs-se a fazê-lo girar com um nervosismo tal que, embora me sentisse prestes a ganhar a batalha, comecei a sentir horror pelo que estava a fazer.





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