A tampa do cofre já estava em brasa, as paredes laterais cederam. Aquele grotesco Scaevola, que acabava de oferecer ao deus da polícia, ao medo, os fundilhos dos calções cor de abrunho, abriu os dois lados da caixa, como se se tratasse de um livro, e deixou escorregar no pano da mesa, de jogo três cartas e duas madeixas de cabelo. Ia sorrir, olhando para Corentin, quando se deu conta de que os cabelos eram de dois brancos diferentes. Corentin soltou a Menina de Cinq-Cygne para vir ler a carta de onde tinham caído as madeixas de cabelo.
Laurence levantou-se também, aproximou-se dos dois espiões e disse:
- Leiam em voz alta; será o vosso castigo! Como eles liam apenas com os olhos, ela própria leu em voz alta a carta seguinte:
«Querida Laurence,
«Soubemos do seu lindo comportamento no triste dia da nossa prisão, meu marido e eu. Sabemos que estima os nossos gémeos queridos tanto e tão bem como nós próprios os estimamos; por isso a escolhemos para guardar um depósito ao mesmo tempo precioso e triste para eles.
«O senhor carrasco acaba de nos cortar os cabelos, pois vamos morrer dentro de instantes, e prometeu-nos que lhe faria chegar, às mãos as duas únicas lembranças nossas que nos é possível deixar aos nossos órfãos bem-amados. Peço-lhe, pois, que guarde estes restos que são nossos, dar-lhos-á em melhores tempos. Aqui deixamos um derradeiro beijo para eles, com a nossa bênção. O nosso último pensamento será primeiro para os nossos filhos, depois para si, e por fim para Deus! Queira-lhes muito.
Berta de Cinq-Cygne.
João de Simeuse,»
Todos tinham as lágrimas nos olhos quando acabou a leitura da carta.
Laurence disse aos dois agentes, numa voz firme, relanceando-lhes um olhar petrificante:
- Os senhores têm menos piedade que o senhor carrasco!
Corentin colocou tranquilamente os cabelos na carta, e pôs esta de lado em cima da mesa, assentando-lhe um cestinho cheio de fichas, para que ela não voasse.