Um Caso Tenebroso - Cap. 6: VI - FISIONOMIAS REALISTAS NO TEMPO DO CONSULADO Pág. 57 / 249

O seu colete de veludo, de riscas enfloradas, cujo corte fazia lembrar os coletes de Robespierre e de Saint-Juste, deixa a descoberto a parte superior de uma gargantilha, de pregas minúsculas, adornada sobre a camisa. Mantinha o calção, mas o seu era de pano azul grosso, com fivelas de aço polido. As meias de filoselle preto modelavam-lhe as pernas de veado, rematadas por grandes sapatos guarnecidos de grevas de pano preto. Conservara o colarinho de musselina pregueado, que um botão de oiro apertava no pescoço. O pobre homem não pensara impor-se uma atitude de eclectismo político ao adoptar este trajo, ao mesmo tempo aldeão, revolucionário e aristocrata. Obedecera apenas, inocentemente, as circunstâncias.

A Senhora de Hauteserre, com os seus quarenta anos, gasta pelas emoções tinha um desses rostos do passado como que sempre em pose para um retrato; e a sua touca de renda, guarnecida de laçadas de fita de cetim branco, mais concorria para lhe dar esse ar solene. Ainda usava pó de arroz, apesar do fichu branco, e do vestido de seda cor de pulga, de mangas chatas, saia rodada, triste e derradeiro trajo da rainha Maria Antonieta. Seu nariz era aquilino, o queixo pontiagudo, o rosto quase triangular, olhos de quem tinha chorado; mas punha nas faces um ligeiro rouge que lhe reanimava os olhos cinzentos. Cheirava rapé, e sempre que o fazia usava dessas lindas precauções de que outrora abusavam as senhorinhas; todos os pormenores da operação constituíam uma cerimônia que se explicava numa só frase: tinha bonitas mãos.

Havia dois anos que o antigo preceptor dos dois Simeuse, amigo do abade de Hauteserre, Goujet de nome, abade de Minimes, procurara na paróquia, de Cinq-Cygne, por amizade para com os Hauteserre e para com a jovem condessa, uma espécie de retiro.





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