De súbito, perguntou com a fronte avincada.
- E para onde foi a Sr.ª D. Ângela?
- Não sei: os meus amigos ainda a viram sair com a criada pela rua acima, tomar para o largo do Laranjal, e não souberam mais nada. Eu, passadas duas semanas, fiz-me de vela para aqui.
- Mas não pode o Sr. Fialho conjecturar onde ela iria ter?
- Quem sabe lá?!
- Ela saiu sem dinheiro?
- Acho que sim. não me faltou nada de casa. Tinha lá umas jóias, que eram da mãe, e deixou-as.
- Então saiu em circunstâncias de pedir esmola?
- Esmola?... Acho que não...
- Por que acha que não?... Uma senhora pobre, educada como fidalga, não exercitada em qualquer trabalho, de repente privada de meios, e indigente, que faria?
- Não sei... lá se avenha...
- Suponha o Sr. Fialho que D. Ângela de Noronha, em vez de trabalhar, porque não sabia, e em vez de mendigar, porque não podia, começou a vender-se porque era bonita!... Se assim acontecesse...
Demorou-se, instantes, sufocado Francisco, e repetiu:
- Se assim acontecesse...
- O senhor parece que está a lagrimejar?!
- Estou, não há dúvida... porque me compadeço dessa pobre senhora...
- Compadece?... Então acha que é bonito uma mulher desonrar um homem de bem?
- Quem é o homem de bem?
- Sou eu...
- O Sr. Fialho?!
- Então vossa senhoria duvida?!
- Não duvido. Tenho a certeza de que o senhor é...
A cadeira de Francisco Costa tremia em vibrações. Ao brasileiro aumentou-se-lhe o espanto, quando viu o doutor erguer-se de salto e lançar mão do chapéu.
- Vai-se embora doutor?!... O senhor não vai bom!... Que é lá isso? Venha cá!
- Lembrei-me que tenho doentes, e a hora de os visitar já passou, mas volto logo - respondeu o médico, examinando o relógio, sem ver a hora.
- Nada... vossa senhoria sabe alguma coisa de minha mulher.