- Eu vou - disse atribulada Ângela - eu vou; que não vão eles fazer-lhes mal, meus amigos. Adeus, adeus, que não nos tornamos a ver... - E, abraçando Joana, balbuciou coberta de lágrimas: - Diga a seu irmão que lhe perdôo, que fez bem em fugir, senão talvez o matassem...
E desceu pressurosamente as escadas.
Logo que saíram à rua, ouviram a estropeada de criados, que eram muitos, acaudilhados pelo capelão, sujeito de má rês.
- Vamos por outro lado - disse Vitorina receando o encontro.
- Não - obstou Ângela. - Se eles me não encontram, são capazes de arrombar a porta desta pobre gente. Vamos direitas a eles. Se não queres vir comigo, vai por outra banda.
- Não, minha menina, hei de acompanhá-la, aconteça o que acontecer... - disse Vitorina.
A poucos passos encontraram a chusma. Ângela parou. O capelão aproximou-se a reconhecê-la, e disse severamente:
- Donde vem vossa excelência?
- Vou para casa - respondeu imperturbada a fidalga.
- Mas donde vem? - insistiu o padre.
- Que lhe importa?
- Importa, sim, senhora - replicou ele, apertando entre os dedos o marmeleiro argolado que vergava sob a pressão daquelas mãos ungidas de sacerdote de Jesus; e prosseguiu: - Eu queria ver a cara ao bandalho; queria mandar as orelhas dele de presente ao senhor general Simão de Noronha.
Ângela ladeou a turba, e, traspassada de súbito medo, seguiu caminho de casa. Os criados, imitando o padre, seguiram-na de perto.
Entrou a senhora pela porta principal. D. Beatriz, rodeada de criadas e vizinhas, estava na primeira sala. Ângela perdeu o ânimo, quando avistou do patim a multidão que estava dentro. Voltou-se então muito desalentada para Vitorina, e disse:
- Quem me dera morrer neste instante!...
O capelão adiantou-se, mandando recolher os criados.