- Que vou mandar chamar sua senhora...
- Pois chame! - bradou ele. - Este negócio há de aclarar-se... Não se me importa a vergonha nem o diabo! Eu sou um homem de bem, Sr. Administrador!
- Quem o duvida?
- Ninhos atrás das orelhas não mos fazem!
- Com razão...
- O meu dinheiro quero saber que fim levou...
- Essas averiguações é que são delicadas, Sr. Fialho, - aconselhou a autoridade. - E parecia-me razoável e prudente que vossa senhoria as guardasse para o secreto da sua casa.
- Mas ela não o diz!
- Se o não diz a vossa senhoria, menos o dirá a mim ou ao juiz...
- Diz que deu um conto e seiscentos e cinquenta mil réis de esmolas! O senhor acredita isto?
- Acredito;... porque não? Se ela repartisse por todos os infelizes do Porto essa grande quantia, estou em que não chegaria um pinto a cada pobre.
- Mas então a criada que diga a quem levava as esmolas. Dá-me vossa senhoria licença que eu pergunte?
- Sim, senhor - respondeu o administrador, e, tangendo uma campainha, disse o oficial de diligencias:
- Essa mulher que entre aqui sozinha.
Entrou Vitorina.
- Responda ali a seu amo - disse a autoridade à presa.
Hermenegildo assoou-se, fez duas upas na cadeira, roçou no pavimento as espaciosas plantas, e rompeu neste interrogatório:
- Quem roubou os brilhantes?
- Fui eu, senhor.
- Mentes! Os brilhantes foi tua ama que tos mandou vender!
Vitorina estremeceu, fitou o administrador, e gaguejou palavras imperceptíveis.
- Foi sua ama que mandou vender os brilhantes? - interveio a autoridade.
- Não, senhor... Fui eu que os... furtei.
E as lágrimas derivavam-lhe pelas faces copiosamente.
“Esta mulher está inocente!” disse entre si o interrogador.
- Mentes, desavergonhada! - trovejou o Sr. Fialho, jogando com as catapultas dos braços à cara da criada.