- Pois isto é um modo de falar; que vossemecê há de ficar sempre conosco enquanto for viva.
Pouco depois, Ângela escutava a exposição de Rita fielmente reproduzida pela criada, tirante as ridiculezas que a sagaz Vitorina omitiu como desconvenientes à gravidade do assunto.
Não obstante a compostura da velha, Ângela sorria-se e duas vezes abafou os froixos da gargalhada. Finda a relação, a filha de D. Maria d’Antas reconcentrou-se, apanhou as fontes nas mimosas mãos e murmurou:
- Qual virá a ser o meu destino?...
Esta pergunta era o epílogo de mil confusas ideias que se lhe embaralhavam na alma, umas sublimes, outras baixas até ao vilíssimo lodo que originariamente foi costela de homem. Com a qual costela bem podem dar-nos na cara as malfadadas a quem frechamos de sátiras, quando uns fumos iriados do prestígio, que lhes doira a nossa poesia, se rarefazem.
- Qual virá a ser o meu destino?
Que interrogação!
É a mulher sem parentes que a faz.
É a mulher que conheceu a pobreza.
E o desamparo.
E o desprezo dos seus.
E as injúrias caluniosas, sem que Deus ou a sociedade a vingassem e a ilibassem.
É a mulher que não vê aurora de melhor dia;
Que um mês antes quase esmolara o custo da passagem dum albergue de caridade para outro;
Que se despenhara das canduras dum primeiro amor à mais rasa, à mais estranha e imprevista miséria.
- Qual virá a ser o meu destino?
Há neste interrogar-se uma abdicação, um alienar direitos de dispor do que quer que seja aspirações a felicidade.
Porque é tudo escuridade e amargura em sua alma. Amargura, se se recorda; escuridade, se olha adiante.
A riqueza, que se lhe oferece, não é a que ela desejava. O meio milhão deste homem não servirá a resgatar da pobreza a família do homem assassinado por sua tia.