- Então seu irmão...
- Meu irmão está comigo, minha senhora. Nunca nos desamparamos um ao outro, e Deus tem sido misericordioso conosco deixando-nos viver juntos...
- Aquela morte de seu marido... - balbuciou a sobrinha de D. Beatriz.
- Não me fale nisso, minha senhora, que ainda se me parte o coração, quando me lembro de o ver cheio de vida e lutando com a desgraça para poder pagar à Sr.ª D. Beatriz, sem vender a casa; e, em poucos dias, matou-o a paixão de se ver desonrado e...
- Sei tudo, sei tudo... - murmurou Ângela apartando-lhe as mãos. - Perdoe-me, sim? - continuou ela com a voz tremente. - Perdoe a quem foi a causa de morrer seu marido...
- A causa, minha senhora, não foi vossa excelência; foi a má estrela que nos perseguia. Ninguém podia prever o que aconteceu. Tão culpada foi a senhora, como eu, como o meu pobre Francisco. Por causa dele também vossa excelência padeceu muito, segundo lá ouvi dizer em Viana a uma criada que foi do convento. Afirmaram-me que vossa excelência chegara a sentir a precisão de trabalhar... Quem diria!...
- E que tem isso? Pior seria se o meu trabalho me não chegasse para o pão de cada dia... - refletiu Ângela.
- Quando contei isto a meu irmão, parecia que a luz dos olhos se lhe apagava nas lágrimas...
As duas senhoras referiram mutuamente a sua história, desde o momento em que se apartaram.
A leitora sensível antes quer ignorar misérias que ali se revelaram as duas amigas; que farte tristezas são já sabidas para piedade e simpatia.
Tinham decorrido três horas de prática entre sorrisos e lágrimas, quando Joana se levantou e disse:
- Deixe-me vossa excelência ir fazer o jantar de meu irmão.
- Espere... - atalhou Ângela, e foi ao seu quarto.
Parou à entrada, e exclamou, como se houvesse medo de entrar:
- Ah!
E, chamando Vitorina, perguntou com aflição:
- As jóias de minha mãe ficaram na quinta, não ficaram?
- Sim, minha senhora.