Não posso ficar, não posso morrer aqui; tenho que escrever, preciso de chegar a casa quanto antes.
E fazendo um grande esforço continuou a caminhar apoiada como estava, com passo vacilante e vagaroso, ansiada, arquejante, parando a todo o momento para receber nos pulmões o ar que lhe faltava.
Eu ia absorvido pelo aspeto de tamanha dor. Acudia-me de longe a longe uma palavra, que não me atrevia a pronunciar, receando que ela pudesse imaginar que eu tentava perscrutar a causa do seu infortúnio com uma indiscrição grosseira.
A rua em que íamos andava-se concertando e estava coberta de uma camada de seixos britados e soltos, por cima de cujos ângulos percucientes e cortantes eramos obrigados a caminhar. Chegávamos à esquina da rua quando ela, voltando-se para a pessoa que a acompanhava, e que então vi ser uma criada, lhe disse:
- Bety, calça-me o sapato. Saiu-me do pé.
A criada ajoelhou-se, e exclamou:
- O cetim está espedaçado! O pé deita sangue!
A condessa pareceu não ouvir, e continuou a caminhar resolutamente.
Maravilhava-me e compungia-me o valor de alma daquela débil natureza, e sentia-me arrebatado a levantar do chão e a transportar nos meus braços aquele formoso corpo tão corajosamente subjugado. Felizmente, de uma travessa próxima desembocou pouco depois uma carruagem de praça, vazia. A condessa, que tinha visivelmente a maior pressa de chegar, entrou, com a criada que a acompanhava, na carruagem que eu mandei aproximar. Fechei a portinhola e disse à condessa baixo, quase ao ouvido, dando-lhe o meu bilhete:
- Minha senhora, quaisquer que sejam as causas, quaisquer que sejam as consequências da estranha aventura que acaba de aproximar-se de V. Exa., vá na firme certeza de que ninguém no mundo saberá do encontro que acabamos de ter.