O Mistério da Estrada de Sintra - Cap. 31: CAPÍTULO IV Pág. 175 / 245

Trouxe um frasco de água de Colonia que estava num lavatório. Humedeci-lhe as fontes e os pulsos, fiz-lhe respirar o álcool. Auscultei-a. O coração começava a bater. O pulso reaparecia.

Eu tinha-me ajoelhado junto da poltrona em que ela jazia e contemplava melancolicamente a sua figura exânime.

Os olhos cerrados, a boca entreaberta deixando ver os dentes miúdos e cor de perola, a cabeça reclinada ao espaldar, davam ao seu rosto, assim em escorço, a expressão de uma figura de anjo, ascendendo de um túmulo. Os pés estreitos e finos, calçados em meias de seda e sapatos de cetim preto sobressaíam da orla do vestido numa imobilidade sepulcral. Uma das mãos, através de cuja lividez se via a rede ténue e azul das veias, tendo no dedo anular um circulo de grossos brilhantes entremeados de rubis, repousava-lhe no regaço, e do seu roupão de rendas pretas exalava-se o mesmo perfume, o perfume dela, que ficara na minha mão a primeira vez que a vi.

Lembrei-me então da sua figura entrevista de noite, ao gaz de um candeeiro da rua, tornada a ver depois, à luz do dia, no Rocio, passando em carruagem descoberta. E estas coisas, tão vivas na minha lembrança, faziam-me todavia, a impressão de haverem passado há muitos anos.

Ela estava velha!

Muitos dos seus cabelos, secos, baços, como mortos, tinham embranquecido nas fontes e no alto da cabeça.

A contração violenta de todos os músculos da dor transformara numa só noite as suas feições e desfigurara a sua fisionomia. Os cantos da boca tinham descaído ao peso das lágrimas como ao peso dos anos, e dois vincos profundos sulcavam-lhe as faces flácidas na mesma direção obliqua que tinham tomado os sobrolhos, riscando-lhe a testa em rugas curvilíneas e transversais.

Que medonha, que tenebrosa,





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