O senhor redator, que julga de ânimo frio, os leitores, que sossegadamente, na sua casa, leem esta carta, poderão melhor combinar, estabelecer deduções mais certas, e melhor aproximar-se pela indução e pela logica da verdade oculta.
Eu achava-me só havia uma hora, quando o mascarado alto entrou, trazendo o chapéu na cabeça e no braço uma capa de casimira alvadia.
- Vamos, disse ele.
Tomei calado o meu chapéu.
- Uma palavra antes, disse ele. Em primeiro lugar dê-me a sua palavra de honra que ao subir agora à carruagem não terá um gesto, um grito, um movimento que me denuncie.
Dei a minha palavra.
- Bem! continuou, agora quero dizer-lhe mais: aprecio a dignidade do seu carater, a sua delicadeza. Ser-me-ia doloroso que entre nós tivesse em qualquer tempo motivos de desdém, ou necessidades de vingança. Por isso afirmo-lhe: sou perfeitamente estranho a este sucesso. Mais tarde talvez entregue este caso à polícia. por agora sou eu polícia, juiz e talvez carrasco. Esta casa é um tribunal e um carcere. Vejo que o doutor leva daqui a desconfiança de que uma mulher se envolveu neste crime: não o suponha, não podia ser. No entanto, se alguma vez lá fora falar, a respeito deste caso, em alguma pessoa determinada e conhecida, dou-lhe a minha palavra de honra, doutor, que o mato, sem remorso, sem repugnância, naturalmente, como corto as unhas. Dê-me agora o seu braço. Ah! esquecia-me, meu caro, que os seus olhos estão destinados a ter estas lunetas de cambraia.
E, rindo, apertou-me o lenço nos olhos.
Descemos a escada, entrámos na carruagem, que tinha os stores fechados. Não pude ver quem guiava os cavalos porque só dentro do coupé achei a vista livre. O mascarado sentou-se ao pé de mim. Via-lhe uma pequena parte da face tocada da luz.