Deleita-te conversando depois contigo e repousando-te no seio tépido da melancolia, dessa deliciosa fada que só aparece evocada pelos namorados e pelos solitários, e que é na terra a irmã mais nova da tristeza, a irmã gatée, a irmã feliz!
Eu no entanto havia cortado a caixa de sardinhas, desgrudado a tampa da terrina e desarrolhado uma garrafa de vinho e uma garrafa de soda que misturara num copo.
Pus-me por fim a comer com apetite, com valor, com delícia, com uma espécie de bestialidade volutuosa, sentindo vagamente adejarem em volta de mim os espíritos benéficos do carcere que bafejaram as prisões de Sílvio Pelico.
É singular isto: achava-me bem!
Depois da ceia acendi um charuto e comecei a passear no quarto, dizendo comigo:
- Visitemos o país!
Na parede que ficava ao lado da porta por onde se entrava havia uma outra porta. Examinei-a. Estava apenas segura com um ferrolho exterior. Afastei a cama encostada à parede em que se achava esta porta e abri-a.
Era um armário na espessura do muro, largo, profundo, dividido a meia altura por um prateleiro espaçoso e solido.
Ocorreu-me que ao fundo do armário haveria talvez um tabique delgado através do qual me seria possível escutar o que se passasse na casa contígua.
Penetrei no armário, estendi-me no prateleiro, escutei. Do outro lado havia um ruido volumoso e maciço. Parecia que se estava arrastando um móvel pesado e grande.
O fundo do armário era efetivamente formado por um tapamento franzino. Era possível que tivesse havido primitivamente uma porta no lugar em que se fizera o armário. Havia um ponto em que a argamassa caíra, e eu via diante de mim um pedaço de ripa atravessada diagonalmente e descarnada da cal.
Peguei no saca-rolhas, e no lugar indicado fui esburacando devagarinho e progressivamente o cimento do muro, até operar um orifício impercetível, pelo qual me era dado ver a luz e ouvir distintamente o que se dizia do outro lado.