O Mistério da Estrada de Sintra - Cap. 12: CAPÍTULO III Pág. 65 / 245

mão misteriosa, ignorado, desconhecido, só, longe de uma mulher amada que o espera talvez a esta hora, longe da família que o acarinhou em pequeno, longe dos lugares saudosos que o viram nascer, da mãe lacrimosa que lhe cerrasse os olhos, do pai angustiado que em nome da humanidade lhe lançasse a derradeira bênção.

Desventurado rapaz! quem sabe as torturas porque passou o teu espírito para se desprender violentamente da terra, deixando na sociedade o seu corpo inerte, impassível, mudo como a interrogação de um enigma posto anonimamente no meio de uma página branca? quem sabe os pensamentos que a morte imobilizou no teu cérebro? quem sabe os afetos que ela enregelou no teu coração, onde há pouco tempo ainda golfava abundantemente a fecunda seiva dessa mocidade esterilizada e extinta agora para sempre?

Pobre rapaz! tão digno de lástima como és, merecedor talvez de profundas saudades, aí estás adormecido no teu sono eterno, vestido de baile, coberto com uma manta de viagem, estirado num sofá, insensível para sempre às alegrias e às amarguras desta vida miserável; e não haverá por ventura uma só que comemore, na história breve da tua passagem na terra, este prazo tão pungentemente melancólico em que os mortos estão esperando dos vivos o derradeiro e supremo favor que a humanidade pode dispensar àqueles que mais presa e que mais ama: a doação da cova em que reside o esquecimento!

Os olhos daqueles que te amam ainda não choram por ti. Estão fechados talvez pelo sono tranquilo e doce, atravessado em sonhos pela tua imagem querida; estão por ventura fitos no conhecido caminho por onde esperam sentir-te chegar, conhecer-te o passo retardado, ouvir-te a voz cantarolando a última valsa que o baile te deixou no ouvido, ver-te finalmente aparecer, descuidado, risonho e feliz.





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