Uma massa enorme mergulhava nas águas. Para nada perder da agonia de sua vítima, o submarino acompanhava-a em sua descida aos abismos. A dez metros de distância vi o rombo no casco do couraçado, por onde a água penetrava com o ronco do trovão. Depois vi a linha dupla dos canhões e por fim a coberta, cheia de sombras negras que se agitavam.
A água subia. Os infelizes agarravam-se aos cordames, trepavam aos mastros, contorciam-se nas águas. Era um formigueiro humano surpreendido pela invasão do mar!
Paralisado, angustiado, os cabelos em pé, os olhos desmesuradamente abertos, respiração ofegante, sem fôlego e sem voz, eu não queria olhar e olhava sempre! Uma irresistível atração colava-me ao vidro.
O enorme navio afundava-se lentamente. O “Nautilus” seguia-o e espiava-lhe os movimentos. De repente ocorreu uma explosão. O ar comprimido fez voar as cobertas do navio, como se houvesse fogo nos paióis. O movimento das águas foi tal que desviou o “Nautilus”.
Então, o infeliz navio mergulhou mais rapidamente. Os cestos das gáveas apareceram carregados de vítimas, depois foram as travessas vergadas sob o peso de cachos humanos e; finalmente, o cimo do mastro principal. A massa sombria desapareceu e com ela uma tripulação de cadáveres arrastados por um formidável redemoinho...
Virei-me para o Capitão Nemo. Aquele terrível justiceiro, verdadeiro arcanjo do ódio, continuava a olhar sua obra infernal. Quando tudo acabou, ele dirigiu-se para a porta do seu quarto e entrou. Eu o segui com o meu olhar.
Por cima do painel do fundo, e por baixo dos retratos dos seus heróis, vi o retrato de uma mulher ainda jovem e de duas crianças. O Capitão Nemo olhou-os por instantes, estendeu-lhes os braços e, ajoelhando-se, rompeu em soluços.