Uma Família Inglesa - Cap. 9: IX - No escritório Pág. 94 / 432

IX - No escritório

Na velha sala de paredes cinzentas e de soalho carcomido pelo caruncho, onde Mr. Richard Whitestone tinha o escritório, havia vinte anos que escrevia, adicionava, subtraía, multiplicava e dividia algarismos, e isto tudo resmoneando, cantarolando e tossindo, o Sr. Manuel Quintino, personagem da idade do seu século, primeiro-guarda-livros da casa, e homem de hábitos de vida tão beneficiadores da saúde do corpo, como mantenedores da serenidade do espírito.

Manuel Quintino era a alma daquele recinto. Na confusão de papéis com que lidava, tais como: – correspondências, facturas, contas-correntes, contas de venda, conhecimentos, primeiras, segundas e terceiras vias de letras, minutas de seguros, recibos e mais documentos comerciais, ele só, habituado desde muitos anos àquilo, podia descobrir uma disposição ordenada.

Disto mesmo se gabava; o que não se devia taxar de presunção de sua parte.

Pedissem-lhe, de repente, a mais insignificante carta, que ele, sem hesitar, iria dar com ela. Era porém seu o segredo desta singular classificação que dera às coisas; para o próprio Mr. Richard, antolhava-se um dédalo o escritório, dédalo onde, ao querer orientar-se, não dispensava nunca o fio condutor das explicações do guarda-livros.

Homem de hábitos regulares, a mais não poder ser, invariavelmente ao soarem as sete horas da manhã, no Verão, e as oito, no Inverno, estava Manuel Quintino movendo a chave na porta do escritório; e meia hora depois, sentado já à banca, todo entregue ao trabalho da escrita. Às três da tarde, no Inverno, e às quatro, no Verão, movia segunda vez a chave, mas em sentido contrário; exceptuando uma ou outra ocasião extraordinária, em que a afluência de serviço o obrigava a serões.

Não era Manuel Quintino destes guarda-livros de mão rápida, e de pronto expediente, que num momento dão solução a muitos negócios juntos.





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