Ele tudo queria feito com tempo, e, a cada momento, dizia: «para pressas é que não era»; graças, porém, à paciência e à regularidade de trabalho, que não perdia nunca, insensivelmente o serviço adiantava-se-lhe nas mãos e difícil seria acharem-no atrasado alguma vez.
Observava pontualmente o judicioso preceito: festina lente, e comprovava, com o exemplo, a eficácia dele.
Queria Manuel Quintino imensamente àquele escritório, tal qual se achava, assim mesmo desataviado e nu. Por vezes, Mr. Richard, e principalmente Carlos, haviam procurado realizar nele certos melhoramentos que o fizessem mais cómodo; tiveram, porém, de recuar diante das repugnâncias do velho guarda-livros, que declarou afligir-se deveras com isso; e, como era ele a parte mais interessada no caso, visto que ali passava grande parte da vida, foi-lhe fácil vencer.
Em resultado disso, continuava a deliciar-se com aquelas quatro paredes escuras, com o tecto de castanho apainelado, que o tempo enegrecera, com o chão áspero e picado pelos insectos, com as janelas de construção antiga, de pequenos caixilhos e abundantes em fechos, aldrabas e postigos, com a porta de fortaleza, cujos gonzos perros tinham um chiar que era para Manuel Quintino como o timbre de uma voz de amigo, agradável ainda quando pouco harmoniosa, com as escrivaninhas, os mochos, os cabides, o lavatório e toda a mobília enfim, feita segundo os velhos modelos dos escritórios antigos.
Eram aquelas as testemunhas do encanecimento dos seus cabelos; como tais as amava.
Além de Manuel Quintino, compunha-se o pessoal do escritório de dois segundos-caixeiros e um rapaz de serviço, a todos os quais o guarda-livros acusava constantemente de mandriões e ao mesmo tempo quase os impedia de trabalhar, pela excessiva disposição que tinha para fazer tudo por suas mãos.