XXVIII - Forma-se a tempestade em outro ponto A Sr.a Antónia não perdera o seu precioso tempo, nem desaproveitara a ciência adquirida por meio das observações da manhã.
Ao voltar a casa, encontrara na rua o Sr. José Fortunato, e a ele, como fiel aliada, comunicara logo ali o pecúlio de descobertas com que enriquecera o tesouro dos seus já numerosos conhecimentos.
José Fortunato horrorizou-se com a série de estupendas notícias que ouviu de tão autorizada boca.
– Não há que fiar nos homens de hoje! – foi a sentença que ele lavrou, depois de ponderar os famosos artigos daquele libelo difamatório.
– A mim não me enganou o melro – fez-lhe notar a Sr.a Antónia.
– Pois olhe que a mim…
– Agora o que é preciso é abrir os olhos fechados que há lá por casa.
– Abrir?!… Melhor seria fechar alguns que já se abriram de mais para ele… Não sei se me entende?
– Entendo, entendo. Não há-de ter dúvida. Sossegue.
E a Sr.a Antónia, serenando assim as apreensões do seu protegido, entrou para casa. José Fortunato ia pensando:
– Se eu avisasse o pai, mas de maneira que não soubesse que era eu…
Cecília andava contente aquela manhã.
O seu bom coração deixara-se repassar todo de alegrias, dessas alegrias travessas, agitadoras, de quem não quer reflectir no que as faz nascer; alegrias que, vindo à luz, gozam da luz como as crianças, as quais a festejam com risos e cantares, ainda sem saudades do passado, nem incertos temores do futuro a amargurarem-lhes tão ingénuo prazer.
Pobre rapariga! Mal sabia ela que bem de perto a seguia a nuvem que havia de assombrar-lhe o fulgor daquele contentamento!
Antónia maquinava em silêncio contra ela. À semelhança da aranha, em traiçoeira emboscada, aguardava paciente que aquela buliçosa borboleta, que voava em volta de si, viesse prender as asas na sua enredada teia.