XII - Outro depoimento – Esteve doente, Cecília? – perguntou Jenny, acomodando o chapéu da amiga.
– Não; por que mo pergunta?
– Nem eu sei. Pareceu-me ler-lhe no rosto… e depois… veio tão tarde.
– Ai, menina – replicou Cecília, sorrindo e ajeitando o cabelo, que o chapéu desordenara – é que se soubesse… Hoje fiz de fidalga. Levantei-me depois das oito horas.
– Sim, preguiçosa? E querem então ver que se esqueceu de trazer aqueles cabeções de que me falou.
– Agora. Olhe; trago esses e até mais alguma coisa…
– Bem, bem; vamos ver isso tudo – atalhou Jenny, com curiosidade.
E as duas raparigas foram sentar-se, uma ao lado da outra, no sofá próximo da janela.
– Veio só? – perguntou Jenny, momentos depois.
– Vim.
– Sem medo?… no dia de Entrudo!…
– Medo nenhum. De minha casa aqui são caminhos que podem dizer-se todos de aldeia. Quase sempre por entre quintas e campos… Encontrei umas criancitas, que vinham da mestra, e conversei com elas todo o tempo.
E, continuando a revistar o interior de um saco de marroquim verde com fechos de aço, lia prosseguiu, mudando de tom:
– Não julgue que lhe vou mostrar nenhuma preciosidade; foi uma distracção de meia hora no serão de sábado. Esta semana tive tanto que fazer, que não pude ocupar-me com estas bagatelas. Bem sabe que não me cresce muito tempo para brincar. Olhe.
E mostrava a Jenny um delicadíssimo primor da arte feminina; um cabeção apenas, mas do qual, se me auxiliassem conhecimentos técnicos, poderia fazer uma descrição, pelo menos do tamanho da que Homero consagrou ao escudo de Aquiles.
Mas a ciência das leitoras e a ignorância provável dos leitores neste assunto não lhes deixarão sentir a lacuna.
– Pois eu ia quase dizer-lhe que inda acho este mais bonito do que o outro que me mostrou há dias – disse Jenny, demorando-se a examinar o cabeção.