Os Brilhantes do Brasileiro - Cap. 9: IX - Amores fatais Pág. 44 / 174

- Querias lê-la, não é assim?! - gritou a velha, tirando-lha da mão com arremesso. - Vai perguntar à criada que ma trouxe se ela quereria casar com o Francisco da Joana...

E, abrindo-a em tremuras de raiva, pôs a luneta e bradou:

- Tu!... Olha isto, filha de Simão de Noronha! Tu... O neto do cozinheiro dá tu à filha do décimo oitavo senhor do paço de Gondar!... Não te envergonhas, Ângela!... Consentiste em semelhante insulto a tua mãe, que era das mais distintas famílias de Portugal?

Como a filha de Maria d’Antas não respondesse, D. Beatriz gesticulou de ombros e cabeça em ar de assombrada, repôs a luneta no olho fundo e mirrado, e leu mentalmente, fazendo esgares com os queixos, ao passo que um novo tu lhe descompunha o aparelho nervoso. Muito é, porém, de notar-se que da leitura da segunda página em diante o rosto da velha denotava espanto sem ira, sem carrancas, sem intermitências de suspiros e ais. Um período especialmente a impressionou de feição que voltou terceira vez a lê-lo, compassando o entendimento de cada frase com um gesto afirmativo de cabeça. A passagem dizia assim:

“Não nos iludamos, minha boa amiga. Pode ser que Deus aproximasse as nossas almas; pode ser; mas, se elas houverem de se encontrar e unir, há de ser na presença de quem as criou, - no céu. Neste mundo, é impossível; e, se fosse possível, a sociedade te obrigaria a chorar rios de lágrimas, e eu mesmo chegaria a sentir o tormento do remorso por ter assassinado as alegrias do teu destino, e destruído as modestas aspirações do meu. Desde que comecei a adorar o que em ti há divino, nem uma hora só entrou em minha alma o pensamento de te ver minha esposa. Era escusado que minha boa irmã estivesse sempre a medir a distância que nos separa. Bem viste que eu ta mostrei na segunda carta que te escrevi; e Deus sabe que eu chorava quando parecia rir da humildade de meu pai, que era um respeitável velho muito pobre, muito resignado, e muito feliz.





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