Uma Família Inglesa - Cap. 20: XX - Manuel Quintino procura distracções Pág. 242 / 432

Apreciam-se tão raros intervalos, em que o Douro, o severo Douro, sorri, como se aprecia um raio de alegria em rosto habitualmente carregado.

Neste sítio, alarga-se o leito das águas, diminui portanto a força da corrente delas, chegando, nas marés baixas, a permitir a formação de pequenos ilhotes de areia, para onde vão brincar as crianças dos pescadores. A tortuosidade das margens, furtando à vista o seguimento do rio, dá a este a completa aparência de um pequeno, mas pitoresco lago. Os olhos descobrem, de um lado, o extenso areal de Quebrantões, ao qual sucedem prados e lezírias sempre verdes, veigas fertilíssimas, arvoredos espessos e, escondidas por o meio, as risonhas casas de algumas pequenas povoações campestres; adiante, as quintas da Pedra Salgada e, através do véu azulado da distância, a aprazível aldeia de Avintes; do outro lado, o palácio do Freixo com seus torreões e balaustradas e as quintas e ribeiras de Valbom e Campanhã. E se é ao fim do dia, quando o Sol doura todo o quadro, reflectindo-se afogueado nas vidraças voltadas ao ocidente, e a viração da tarde enfuna as velas brancas das pequenas embarcações do lugar, e o céu é azul e as águas límpidas, a paisagem compensa bem os privados de gozar as belezas mais celebradas por viajantes e poetas, as análogas das quais só a nossa cegueira nos não deixa às vezes ver a dois passos da porta.

Era aqui que Manuel Quintino se sentava sempre, durante alguns minutos, sobre uma pedra solta da margem.

– Como isto é bonito! – pensava ele. – É que nem há outro passeio assim, nos arredores do Porto. E a tarde então está tão serena e sossegada, que até se percebe daqui tudo o que se diz no Areinho. Se eu tivesse dinheiro, era onde comprava uma quinta. Chegando aos sábados, saía do escritório e metia-me num barco… ou a pé mesmo… Afinal era um passeio… É verdade que se viesse Cecília, sempre era longe.





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