Uma Família Inglesa - Cap. 27: XXVII - O motivo mais forte Pág. 305 / 432

XXVII - O motivo mais forte

Meia hora depois, ouviu Carlos o rodar da carruagem que levava Mr. Richard e Jenny à hospedaria em que estava alojado Mr. Smithfield.

Julgara que respiraria satisfeito, quando tivesse, enfim, conseguido ficar toda aquela noite à sua própria disposição; mas cedo reconheceu que esperava em vão.

Há situações na vida em que, para qualquer lado que a resolução nos encaminhe, gera-se-nos sempre no ânimo um remorso, mais ou menos intenso, por haver abandonado os outros.

Em uma destas dilemáticas contingências se tinha achado o espírito de Carlos.

Na véspera havia de facto prometido, não a Manuel Quintino, como à irmã dissera, mas a Cecília, o que maior força dava ainda à promessa, que não faltaria à festa, disfarçadamente planeada por ela, para celebrar o restabelecimento do velho.

Era uma espécie de inocente conspiração entre os dois; e é provável que o leitor ou leitora não ignorem o ardor com que, de ordinário, o coração se vota a este género de empresas, com este género de alianças.

Carlos não tinha coragem de faltar, nem que fosse para suspender aquelas lágrimas que vira iminentes nos olhos da irmã. Resistiu pois, como vimos.

Mas a resistência deixou de si vestígios dolorosos; aquele pesar, causado a Jenny, sentia-o ainda o coração de Carlos; ficara-lhe a dor íntima, que até os alvoroços de prazer, excitados pela lembrança da próxima entrevista com Cecília, pareciam exacerbar.

Porque há destas contradições nos sentimentos humanos; é por a mesma razão que, às vezes, a negrura dos presságios mais se condensa entre os maiores fulgores da felicidade, e que se aviventa a luz de vagas esperanças nas mais tenebrosas situações da vida.

As horas, porém, adiantavam-se, e Carlos preparou-se para o serão festivo que o esperava.





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