Previu a iminente derrota da filha, perante um documento, cuja existência ela não suspeitava; previu as consequências desta cena; o perigo que corria a reputação de Cecília; o descrédito que resultaria para o nome de Carlos, que era também o dele – Richard – e o de Jenny; e imediatamente talhou para si papel em uma situação na qual ele só poderia intervir com bom êxito.
Manuel Quintino, ouvindo ao patrão aquelas palavras, ditas em tom firme e seguro, ficou a olhá-lo embaraçado.
Jenny fitou as feições inalteradas do pai e compreendeu-o.
A boa e generosa menina sentiu desejos de se lhe lançar ao colo, para lhe agradecer aquela pronta e feliz resolução.
Carlos conheceu que lhe coravam as faces, ao ver quanta magnanimidade havia no procedimento do pai.
Era a segunda lição que, naquele dia, recebia dos seus; lição de grandeza de alma, salvadora da reputação de uma pessoa, que ele sinceramente amava, mas que, com actos irreflectidos, pela segunda vez ia perdendo.
– Esta carta é de V. S.a? – repetiu Manuel Quintino, deixando sensivelmente cair a carta, que conservava na mão.
Jenny correu a apanhá-la e passou-a para as mãos de Mr. Richard, que trocou um olhar de inteligência com a filha.
Travara-se naquele momento tácita aliança entre os dois para salvar a reputação de uma rapariga, inocente e indefesa.
– É minha, sim – continuou Mr. Richard, tomando a carta e abrindo-lhe naturalmente o fecho. – É minha… ou melhor, é… de nós ambos – acrescentou, designando Carlos com a mão, mas sem o fitar. – Tínhamos resolvido preparar uma surpresa a Jenny hoje, que é o dia de seus anos, convidando Cecília, que há tempos não víamos aqui. Mas gorou-se o plano, porque Jenny, já antes de nós, a tinha convidado; e fez muito bem. Aí está o que é… Esta carta foi escrita por Carlos e ditada por mim… E se duvida? – concluiu, fazendo o gesto de entregar a carta a Manuel Quintino.