– Julguei que Jenny não conhecia o mundo por o ter visto nas páginas dos romances.
– Não, senhor; não o conheço daí; mas também o não conheço por experiência pessoal. Das lições de meu pai obtive o pouco que dele sei; por isso avalio o bom e o mau das nossas acções na vida, à luz do dever e da consciência. Não foi o que me ensinou?
Mr. Richard aceitou com um sorriso a correcção filial.
– Pois foi à luz do dever e da consciência que eu procedi.
– Julguei que, depois do acontecido, o dever lhe aconselharia outra coisa.
– Algum absurdo? Loucuras?… Fantasias? És mulher afinal, Jenny!
Jenny aproximou-se do pai, que viera sentar-se em uma cadeira junto do fogão, apoiou-se-lhe ao ombro e, a meia voz, disse-lhe como a brincar:
– Desejava agora, por um momento só, deixar de ser sua filha, senhor.
– Para quê?
– Para me atrever a fazer-lhe uma pergunta.
– Autorizo-te a fazê-la, Jenny – respondeu o inglês, completamente desarmado contra a diplomacia da filha.
– Autoriza? Eu sei?!
– Exijo até que a faças.
– Sou mulher afinal! disse o pai… Pode ser… E como mulher tenho talvez o meu fraco pelo sentimento – preconceitos do coração… Não é isto?… Mas… era a pergunta que eu, se não fosse sua filha, lhe quereria fazer: mas esse seu espírito, recto, esclarecido e forte… julgará sem preconceitos desta vez?
– Que preconceitos queres que sejam os meus? – perguntou Mr. Richard, desviando os olhos.
– Quem sabe lá? Cecília é filha de Manuel Quintino, um homem honrado, mas… subalterno; fiel, mas… pobre; um carácter generoso, mas… educado na escola da obediência; capaz de se sacrificar por nós, mas… vivendo dos ordenados da nossa casa.