A roda da civilização, a que aplicais ombros com tanto denodo, não se cravará por isso. - Podeis, elegantes meninas, cantar loas sem escrúpulo diante do presepe armado na sala mais íntima da casa, que nem por isso cantareis pior na das visitas as árias italianas que aprendestes no colégio; não coreis de colaborar, por excepção, esta noite nos misteres da cozinha, que sobra de água-de-colónia e perfumes tendes no toucador para as abluções purificatórias. Homens graves, a república perdoar-vos-á uma pequena infidelidade, a política do país e da Europa não periclitará, desnorteada, se, por um pouco, lhe negardes a vossa atenção; humanizai-vos, pois, uma vez por ano, e baixai ao seio da família os olhares que poderosos empenhos vos trazem sublimados. - Entrai com as crianças em jogos pueris e fáceis, que não destemperareis a inteligência para as filosóficas cogitações do boston e do whist.
A família do Mosteiro era fiel às clássicas usanças desta noite tradicional. E naquele ano sobretudo as festas das consoadas deviam ser coisa falada, graças ao plano de D. Vitória de reunir no Mosteiro a resumida família de Alvapenha; plano que vimos aprovado por aclamação por toda a assembleia presente.
D. Doroteia veio efectivamente na companhia de Henrique de Souselas e de Maria de Jesus.
Foram recebidos no Mosteiro por uma completa ovação das crianças.
D. Doroteia viu-se literalmente enlaçada em braços infantis, que lhe tolhiam os movimentos e que, dizia ela, quase ameaçavam asfixiá-la.
Tudo isto dava motivo a exclamações e risos, que inauguraram um estado de coisas, o qual nunca mais devia cessar aquela noite.
A balbúrdia, a azáfama festiva que ia no Mosteiro é indescritível.
Na cozinha, nas salas, nos corredores tudo era movimento e ruído.